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quarta-feira, 1 de maio de 2019

Romance policial: um género literário menor ou um nicho de culto?



Considerado por alguns como um género menor da literatura, o romance policial ganhou nos últimos anos um novo fulgor e reconhecimento com a chamada “literatura policial nórdica”. Nomes como os dos suecos Stieg Larsson, Henning Mankell, Camilla Läckberg ou Lars Kepler (pseudónimo do casal formado pelo sueco Alexander Ahndoril e pela portuguesa Alexandra Coelho Ahndoril); dos noruegueses Jo Nesbø e Jørn Lier Horst, ou ainda dos islandeses Arnaldur Indridason e Yrsa Sigurdardóttir tornaram-se conhecidos de grande parte dos leitores deste género literário que esperam ansiosamente pela publicação ou reedição de mais um dos seus romances.





O romance policial terá surgido em abril de 1841, nas colunas de um jornal de Filadélfia, o Graham's Magazine, com a publicação de Os Crimes da Rua Morgue, de Edgar Allan Poe, a história do assassinato brutal de duas mulheres em Paris, investigados pelo detetive C. Auguste Dupin. A este, seguiram-se O Mistério de Marie Roget (publicado entre 1842 e 1843, a partir da história verídica do assassinato de uma jovem em Nova Iorque) e A Carta Roubada (publicado em 1844, o último caso do detetive Dupin, sobre o roubo de uma carta dos aposentos privados da rainha e cujo conteúdo seria muito comprometedor se revelado).


Edgar Allan Poe

O surgimento deste tipo de narrativa no século XIX (as chamadas “narrativas de enigma”) tem sido associado à explosão urbana, ao aumento do crime, à ascensão da ideologia burguesa e ao aumento do público leitor ocorridos nesse século.
[A este propósito, recomenda-se a leitura das obras O crime em lisboa, 1850-1910 e Crime e sociedade. Portugal na segunda metade do século XIX, da historiadora portuguesa Maria João Vaz.]


O universo do romance policial clássico caracteriza-se, em termos estruturais, pela presença de elementos como o crime/a vítima, a investigação/revelação do culpado, a que se acrescenta uma dose de medo, mistério, investigação, curiosidade, espanto e inquietação, procurando sempre uma completa verossimilhança.
O foco do romance policial remete, assim, para o processo do esclarecimento do mistério, geralmente a cargo de um detetive, seja ele profissional ou amador, adotando muitos detetives, como por exemplo, Sherlock Holmes, criado por Arthur Conan Doyle, métodos científicos em busca da verdade. O romance ou conto policial tenta sempre responder às questões: Quem é o culpado? Qual a razão do crime? Que processos se utilizaram para resolver esse mesmo crime?
Entre os grandes nomes da literatura policial clássica, em que a identidade do culpado só é revelada nas últimas páginas do livro, contam-se, além dos dos já referidos Edgar Allan Poe e Arthur Conan Doyle, Agatha Christie, P. D. James, Raymond Chandler, Erle Stanley Gardner, Dashiell Hammett ou Georges Simenon, mas também o italiano Andrea Camilleri ou o espanhol Manuel Vásquez Montalbán.


Num registo diferente, entrando naquilo que alguns críticos classificam como romance policial psicológico, destacam-se os já referidos autores nórdicos, mas também a norte-americana Patricia Highsmith ou a inglesa Ruth Rendell (que também publicou sob o pseudónimo Barbara Vine), que terão sido as percursoras deste estilo, que, mantendo a estrutura clássica da trilogia crime/investigação/revelação, dá mais importância à narrativa em si mesma, com a descrição da personalidade e do tipo psicológico do ou dos suspeitos, criando entre o leitor e o criminoso uma empatia, como a que vivenciamos com o falsário sedutor Tom Ripley, de Highsmith, chegando muitas vezes o leitor a esperar que o crime compense e o suspeito seja absolvido.

Em Portugal, um dos primeiros livros policiais publicados terá sido O Mistério da Estrada de Sintra, um romance da autoria conjunta de Eça de Queirós e de Ramalho Ortigão, publicado no Diário de Notícias, de Lisboa, sob a forma de cartas anónimas, entre 24 de Julho e 27 de Setembro de 1870, recebendo a primeira versão em livro em 1884.

Outros nomes se distinguem, entre os quais o de Dennis McShade, pseudónimo de Dinis Machado, criado em 1967, Francisco José Viegas, Pedro Garcia Rosado, Francisco Moita Flores ou Nuno Nepumoceno.


E que dizer de Quaresma, Decifrador, título geral que se atribuiu ao conjunto das treze novelas policiárias escritas por Fernando Pessoa e que a editora Assírio & Alvim publicou em maio de 2014?


Para Fernando Pessoa, a literatura policial seria um dos «poucos divertimentos intelectuais que ainda restam ao que resta de intelectual na humanidade». Para além de um leitor entusiasta de todas as novidades que as editoras inglesas publicavam nesta área, Pessoa foi também, ao longo da sua vida literária, escritor de histórias policiais, dedicando a esta vertente da sua obra muito tempo e atenção.
O fio condutor das novelas de Quaresma, Decifrador é a figura de Abílio Fernandes Quaresma, médico sem clínica, raciocinador e decifrador de charadas, sua leitura preferida, e das da vida real, uma figura paradoxal pelo contraste criado entre a debilidade física e o fulgor do raciocínio dedutivo. Raciocinador minucioso e analítico, tal como o autor, Quaresma é apresentado no «Prefácio» das novelas como um amigo de longa data, recentemente falecido, alguém que realmente conduz os seus passos pelas Ruas de Lisboa, tal como outros alter-egos pessoanos.

[Temos consciência de que muitos são os nomes que faltam nesta breve resenha sobre romance policial: clássicos americanos como Rex Stout, Ellery Queen ou Ed McBain, ou os mais recentes Dennis Lehane, James Patterson, Daniel da Silva ou  Stephen King; as britânicas Robert Galbraith (pseudónimo de J. K. Rowling), Paula Hawkings ou Val McDermid; os espanhóis Arturo Pérez-Reverte, Domingo Villar ou  Antonio Muñoz Molina; o suiço Joel Dicker; ou ainda o improvável zimbabweano Alexander McCall Smith, com a detetive Preciosa Ramotswe, fundadora da Agência Nº 1 de Mulheres Detetives, no Botswana.
Aqui fica apenas um piscar de olhos a todo um mundo por descobrir... 

Para saber mais sobre romance policial, consultar: 

literatura policial in Artigos de apoio Infopédia [em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2019. Disponível na Internet: https://www.infopedia.pt/apoio/artigos/$literatura-policial. [consult. 2019-04-28].





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