“Estava uma manhã resplandecente, como uma pérola opalina do colar daquele mês primaveril. Era o ano de 5266 para os cristãos-novos. O sexto dia de abril de 1506 para os [...] cristãos de alma e coração. [...] O dia do nosso primeiro seder da Páscoa ergueu-se fusco e seco, como todas as manhãs ultimamente. Há mais de onze semanas que não recebíamos a benção da chuva. E também hoje não choveria...”
Richard Zimler – O último cabalista de Lisboa. Lisboa:
Livros Quetzal. 1ª edição 1996. Tradução de José Lima
Lisboa, abril de 1506. Durante as
celebrações da Páscoa, cerca de dois mil cristãos-novos foram mortos num pogrom (movimento popular violento
organizado contra uma comunidade, em especial uma comunidade judaica) e os seus
corpos queimados no Rossio. Reinava então D. Manuel, o Venturoso, e os frades
incitavam o povo à matança, acusando os cristãos-novos de serem a causa da fome
e da peste que flagelavam a cidade.
Em dezembro de 1496, quatro anos
depois de expulsarem do seu reino todos os judeus, os soberanos de Espanha, D.
Fernando e Dona Isabel, haviam convencido o rei de Portugal, D. Manuel, a expulsar
todos os judeus de Portugal como condição para lhe concederem a mão da sua
filha. Segue-se um processo de conversão forçada dos judeus ao cristianismo –
que passam a ser designados por «cristãos-novos» –, mas muitos continuam
clandestinamente a praticar os seus rituais religiosos.
Em 1506, Portugal vive um período de seca prolongada e de peste que dizima milhares de habitantes; é preciso encontrar um culpado, um bode expiatório para esses males. Os judeus (a quem chamam «marranos») são então o alvo a abater. Os frades dominicanos dirigiam e incitavam as levas de cristãos sedentos de violência, vingando-se nos judeus e cristãos-novos acusados de todos os males que então se viviam.
O relato que constitui O Último Cabalista de Lisboa é feito a partir de uns manuscritos escritos entre 1507 e 1530 por Berequias Zarco e encontrados nos anos 90 do século XX numa velha casa de Istambul. Neles descreve-se o massacre de Lisboa em 1506 e conta-se a odisseia vivida pela família Zarco, uma família de cristãos-novos residente em Alfama naquele período de convulsão. Berequias Zarco, Pedro por batismo cristão forçado, é sobrinho e discípulo de Abraão Zarco – iluminador e membro respeitado da célebre escola cabalística de Lisboa.
No domingo de Páscoa, Berequias
encontra o tio e uma jovem desconhecida mortos na cave que
servia de templo secreto desde que a sinagoga fora encerrada pelos
cristãos-velhos. Abraão Zarcoi e a jovem misteriosa estão ambos nus e envoltos num mar de sangue; as suas gargantas parecem ter sido cortadas por uma faca judaica, uma shoet, e o alçapão da cave está fechado por dentro. Também desapareceu do seu esconderijo um valioso manuscrito iluminado, a Haggada (o texto utilizado para os serviços da noite do Pessach, a Páscoa judaica, que contém a história
da libertação do povo de Israel do Egito conforme é descrito no Livro do Êxodo
e as orações, canções e provérbios judaicos que acompanham esta festividade). Estarão os dois incidentes relacionados?
Terá sido um cristão ou um judeu, como os indícios fazem crer, a assassinar o tio?
Quem será a rapariga morta?
Beremias, um dos sobreviventes do
massacre de Lisboa, decidiu fugir para Constantinopla quando percebeu que em
Portugal não havia futuro para si e para a sua família, pelo facto de serem
judeus. O relato escrito dessa experiência terrível em Lisboa esteve
interrompido durante largos anos, mas em 1530 quis terminá-lo quando decidiu
regressar a Lisboa, na sequência de uma visão do seu grande mestre o tio Abraão
Zarco...
Richard Zimler
Richard Zimler nasceu em 1956, em
Roslyn Heights, um subúrbio de Nova Iorque. Fez um bacharelato em Religião
Comparada na Duke University e um mestrado em Jornalismo na Stanford
University. Trabalhou como jornalista durante oito anos, principalmente na
região de São Francisco. Em 1990 foi viver para o Porto, onde lecionou
Jornalismo, primeiro na Escola Superior de Jornalismo e depois na Universidade
do Porto. Tem atualmente dupla nacionalidade, americana e portuguesa. Desde
1996, publicou doze romances, uma coletânea de contos e seis livros para
crianças. O Último Cabalista de Lisboa,
o seu primeiro romance publicado, catapultou Zimler para o sucesso
internacional, tendo sido publicado em toda a Europa, nos Estados Unidos e
Brasil, onde depressa se tornou uma obra de referência.
Com uma obra muito marcada pela
experiência judaica (a história, a cultura, as perseguições, o antissemitismo),
Richard Zimler centra-se sempre nas relações humanas e nos sentimentos que
atravessam gerações, abordando também questões tão pungentes e controversas
como a homossexualidade, a emigração e a dificuldade de relacionamento entre as
pessoas, obrigando-nos a uma reflexão sobre a essência do ser humano e de como
as situações que se nos deparam podem alterar irremediavelmente a forma como
olhamos o mundo.
Para mais informações sobre Richard Zimler e a sua obra, visite o site
https://www.zimler.com/pt/bem-vindo
Na biblioteca do ECB pode encontrar também as obras de Richard Zimler:
À procura de Sana, 2005
Em fevereiro do ano 2000, Richard Zimler desloca-se
à Austrália para participar no Encontro de Escritores de Perth. Aí, conhece
Sana, uma bailarina brasileira que lhe diz que o seu livro O Último Cabalista de Lisboa influenciou profundamente a sua vida.
Um dia depois, Sana suicida-se, atirando-se da janela do hotel em que ambos
estão hospedados.
Zimler torna-se então personagem do seu romance e, simultaneamente, investigador e narrador. As suas buscas levá-lo-ão a Paris, onde conhece Helena, amiga de infância de Sana. Porém, à medida que vai desenrolando o fio da vida de ambas – que começa em Haifa, numa época em que a convivência pacífica entre uma palestiniana e uma judia era ainda possível –, vê-se envolvido numa teia de ilusões, crueldade e vingança que culminará no 11 de Setembro de 2001.
A sétima porta, 2007
Em Berlim, na década de Trinta, Isaac Zarco,
descendente de Berequias Zarco, protagonista de O último cabalista de Lisboa, está determinado a descobrir o que
revelavam seis manuscritos escritos por Berequias Zarco e encontrados em 1990 numa
cave de Istambul. Isaac está convencido que o pacto entre Hitler e Estaline, o Pacto
Molotov–Ribbentrop, assinado em agosto de 1939 e que estabelecia esferas de
influência entre as duas potências, anuncia uma profecia apocalíptica feita
pelo seu antepassado que está prestes a concretizar-se. Acredita também que, se
conseguir descodificar esses textos cabalísticos medievais, pode salvar o
mundo.
Passado durante a subida ao poder
de Hitler, o romance A Sétima Porta
junta Sophie Riedesel e um grupo clandestino de ativistas judeus e antigos
fenómenos de circo liderados por Isaac Zarco. Quando uma série de
esterilizações forçadas, estranhos crimes e deportações para campos de
concentração dizimam o grupo, Sophie, já adulta, tem de lutar com todo o seu
engenho para salvar tudo o que ama na Alemanha.
Polónia, ano de 1940. Os nazis isolam milhares de
judeus num pequeno gueto em Varsóvia. Erik Cohen, um velho psiquiatra judeu,
vê-se obrigado a partilhar um pequeno apartamento com a sobrinha e o sobrinho-neto
de nove anos, Adam.
Certo dia, Adam desaparece e o seu corpo,
estranhamente mutilado, só é encontrado na manhã seguinte, no arame farpado
sobre o muro que rodeia o gueto. Quando um segundo cadáver aparece em circunstâncias
muito similares – desta vez o de uma rapariga judia –, Erik e o seu velho amigo
Izzy tentam obter respostas, lançando-se numa investigação tão sinistra quanto
perigosa.
O mistério adensa-se e as dúvidas também. Serão os
próprios nazis responsáveis por aquelas mortes ou estará um traidor judeu
envolvido nos crimes?
Partindo do episódio da ressurreição de Lázaro por
Jesus, descrito no Novo Testamento, no Evangelho segundo São João, Richard
Zimler procura resposta para as questões que rodeiam essa ressurreição: como é
que Jesus Cristo realizou o milagre? Teria algum motivo especial para o fazer?.
Em O Evangelho segundo Lázaro, preenche
estas e outras lacunas, narrando a história da perspetiva de Lázaro,
descrevendo como ele e Jesus se conheceram em crianças, a transcendência da
ligação que os une e o momento em que Lázaro acordou no túmulo, desorientado e
sem qualquer memória de uma vida após a morte.
Apenas trinta anos depois da
crucificação do seu velho amigo, Lázaro começa a entender a extensão do papel
que sempre ocupou na vida de Jesus e talvez ainda venha a ocupar. É que a
derradeira prenda de Jesus a Lázaro – deixada num dos locais malditos de
Jerusalém – parece conter a chave que ajudará Lázaro a concretizar os desígnios
de uma Terra Prometida. Deverá ele arriscar tudo e levar a cabo os perigosos
planos de Jesus?
Benjamin Zarco e o seu primo Shelly foram os únicos
membros da família a escapar ao Holocausto. Cada um à sua maneira, ambos
carregam o fardo de ter sobrevivido a todos os outros. Benjamin recusa-se a
falar do passado, procurando as respostas na cabala, que estuda com avidez, em
busca daquilo a que chama os fios invisíveis que tudo ligam. E Shelly
refugia-se numa hipersexualidade, seu único subterfúgio para calar os fantasmas
que o atormentam.
Construído como um mosaico e
dividido em seis peças, Os dez espelhos de Benjamin Zarco entretecem-se entre
1944, com a história de Ewa Armbruster, professora de piano cristã que arrisca
a vida para esconder Benni em sua casa, e 2018, com o testemunho do filho de
Benjamin acerca do manuscrito de Berequias Zarco, herança do pai, talvez a
chave para compreender a razão por que Benjamin e Shelly se salvaram e o
vínculo único que os une.
Publicado originalmente em 1996,
e inédito até agora em Portugal, Insubmissos é um romance vívido e intimista
que ousa dar luz a temas como a SIDA, a homossexualidade, a solidão, o luto e o
amor nas suas imensas variantes.
Depois da morte de muitos dos seus amigos, um
professor de guitarra clássica, mundano, judeu e antiga estrela da equipa de
basquetebol de Greenwich Village, decide abandonar os Estados Unidos e procurar
uma nova vida em Portugal. Mas aquilo a que ele chama o eclipse viral da
sexualidade persegue-o até ali, quando António, o seu mais talentoso aluno,
testa positivo para VIH e ameaça desistir da vida aos vinte e quatro anos.
Desesperado por mostrar ao jovem que ele ainda tem um futuro pela frente, «o
Professor» organiza uma viagem de carro com destino a Paris, esperando ser
capaz de convencer um virtuoso a aceitá-lo como aluno. O pai de António, um
homem rígido e presença distante na sua vida, decide acompanhá-los e, de
passagem, os três mergulham num triângulo de aventuras, violência e revelações
pessoais. Será que de caminho vão encontrar uma oportunidade de redenção?
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