“[...] resolvi escrever sobre os acontecimentos que ocorreram em Tarcisis, durante a minha magistratura. [Quero] que este livro sirva de lição a quem o ler. Seja eu, então, claro, preciso, atento, verdadeiro, hábil, imaginativo, e assim me inspire a Providência. E não recusarei sequer a intercessão de certo deus que, nos primórdios, ao que parece, passeava num jardim, pela brisa da tarde.”
Mário de Carvalho. Um Deus passeando pela brisa da tarde. Lisboa: Editorial Caminho, 1994, 1ª edição
Neste romance de caráter
histórico, passado em Tarcisis, cidade fictícia da Lusitânia do séc. III d.C., Mário
de Carvalho (que garante, numa epígrafe provocatória, não se tratar de um
romance histórico, pois “Tarcisis nunca existiu...”) reconstitui as
características culturais, políticas e quotidianas do Império Romano, sem nunca
esquecer a «intercessão de certo deus que, nos primórdios, ao que parece,
passeava num jardim pela brisa da tarde...».
Aos 213 anos da era de Augusto, Lúcio Valério Quíncio é um duúnviro que governa Tarcisis, cidade romana da Lusitânia, região do império romano sob a liderança do imperador Marco Aurélio Antonino, e exerce a magistratura juntamente com Gaio Cecílio Trifeno. Embora seja um cargo exercido por dois magistrados, Lúcio vê-se, por força morte inesperada de Trifeno, obrigado a desempenhá-lo sozinho, num momento político difícil. Em Tarcisis, apesar de coabitarem diversas religiões e deuses, um grupo de cristãos vai merecer a desconfiança e a ira dos restantes habitantes. Como dirigente máximo, cabe a Lúcio Valério Quíncio tomar todas as decisões, enquanto tumultuosos acontecimentos conduzem a pequena cidade ao descontentamento geral. No exterior, notícias de uma invasão bárbara iminente, proveniente do Norte de África, obrigam-no a drásticas medidas, enquanto, no interior das muralhas, uma nova seita, a Congregação do Peixe, põe em causa os valores da romanidade, evocando os ensinamentos de um obscuro crucificado.
Duas ameaças põem então Lúcio Valério
Quíncio à prova: o ataque dos povos famintos que vêm do outro lado do estreito
(os mouros) e a paixão devastadora por Iunia Cantaber, filha de um amigo aristocrata que
se converteu ao Cristianismo e desafia as autoridades temporais.
O tempo corre, os acontecimentos
precipitam-se fora do controlo de Lúcio, que, solitário no exercício do poder,
apenas pode contar com o apoio de Mara, sua mulher.
Em Um Deus passeando pela brisa
da tarde, Mário de Carvalho oferece-nos uma história contada na primeira
pessoa, de uma impressionante sobriedade e solidez. Lúcio, a personagem
principal, surge como uma luz límpida, mas ténue, prenunciando a queda do Império
Romano e o surgimento de uma nova era.
Mário Costa Martins de Carvalho
nasceu em Lisboa, em 1944, e tem publicada uma vasta obra que integra romances,
contos, peças de teatro, ensaios e argumentos para cinema.
Em 1981, com a publicação do seu
primeiro livro, Contos da Sétima Esfera,
causou surpresa pelo inesperado da abordagem ficcional e pelas peculiares
atmosferas em que decorrem os contos, entre o maravilhoso e o fantástico.
Com Um Deus passeando pela brisa da tarde, publicado pela primeira vez
em 1994 e do qual já surgiram muitas reedições, Mário de Carvalho obteve
sucessivos prémios, entre os quais o Prémio Pégaso de Literatura, o Prémio
Fernando Namora, o Prémio de Romance e Novela da APE e o Prémio Literário
Giuseppe Arcebi. Traduzido para inglês, francês, alemão, italiano e outras
línguas, em capa dura e edições de bolso, é um livro recomendado para o Ensino
Secundário como sugestão de leitura.
Para conhecer mais sobre a vida e a obra de Mário de Carvalho, consultar neste blogue
https://bibliotecaecb.blogspot.com/2017/09/autor-do-mes-de-setembro-mario-de.html
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