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terça-feira, 31 de outubro de 2017

O fantasma dos Canterville, de Oscar Wilde


“- Não durmo há trezentos anos – disse, tristemente, e Virgínia abriu os seus lindos olhos de espanto; - há trezentos anos que não durmo e estou tão cansado!”
Virgínia ficou muito séria e tremeram-lhe os lábios como pétalas de rosa. Chegou-se ao pé dele e, ajoelhando ao seu lado, olhou para o seu velho rosto embranquecido.
“- Meu pobre Fantasma! - murmurou. Não tem sítio onde possa dormir?”
“-Para além dos pinhais - respondeu numa voz baixa e sonhadora - há um jardim. As ervas crescem aí muito, há aí as grandes flores brancas de cicuta e o rouxinol canta pela noite fora. Pela noite fora canta ele e a lua fria e cristalina olha para baixo e o teixo estende os seus braços gigantescos sobre os que dormem.
Os olhos de Virgínia encheram-se de lágrimas e escondeu o rosto nas mãos.
“- Está a falar do Jardim da Morte – disse ela baixinho.
“- Sim, da Morte. A morte deve ser tão linda! Deitar-se na terra macia e castanha com as ervas a acenar por cima das nossas cabeças e a ouvir o silêncio. Nem ontem nem amanhã. Esquecer o tempo, esquecer a morte, estar em paz. Você pode ajudar-me. Pode abrir-me os portais da Morte da casa, pois o Amor está em si e o Amor é mais forte do que a Morte.
Virgínia estremeceu, correu por um momento um calafrio por ela abaixo e houve um silêncio de alguns minutos. Parecia-lhe estar num sonho horrível.
Então o Fantasma voltou a falar e a sua voz parecia um gemido do vento.
“- Já alguma vez leu a velha profecia que está na vidraça da biblioteca?”
“- Ah Muitas vezes! – exclamou a rapariga, e levantou a cabeça. – Conheço-a muito bem. Está pintada numas letras pretas muito estranhas e é difícil de ler. São só seis versos:
Quando uma menina loura conseguir
Preces dos lábios do pecado,
Quando a velha amendoeira florir,
E houver choros de criança,
Toda a casa fica em paz
Que volta enfim a Canterville.”

In O Fantasma dos Canterville,
de Oscar Wilde (Editorial Estampa, 1973, pp. 37-38)





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