menu

quinta-feira, 26 de março de 2020

Dia do Livro Português


Em 1487, imprimiu-se o primeiro livro em Portugal, o Pentateuco, em hebraico, que saiu das oficinas do judeu Samuel Gacon, na Vila-a-Dentro, em Faro. Esta data, criada pela Sociedade Portuguesa de Autores (SPA), tem por objetivo realçar a importância do livro e da língua portuguesa em todo o mundo e no saber da humanidade em geral.
O primeiro livro escrito em português, Constituições que fez o Senhor Dom Diogo de Sousa, Bispo do Porto, foi impresso no Porto, em 1497, por Rodrigo Álvares, o primeiro impressor português.

Este ano, quando a grande maioria da população portuguesa está em casa a cumprir o estado de emergência imposto pela pandemia de Covid-19 e tem, por isso, mais tempo para a leitura, algumas editoras foram obrigadas a suspender a produção de novidades, mantendo as vendas online.
Este momento de confinamento e isolamento trouxe também oportunidades para aqueles que resolveram partilhar a leitura nas redes sociais.
E porque ler livros portugueses é a melhor forma de homenagear os escritores portugueses, deixamos aqui uma sugestão que nasceu da iniciativa da escritora Ana Margarida de Carvalho.

(foto de perfil da página de facebook Bode Inspiratório)

O projeto Bode Inspiratório junta cerca de 50 escritores que foram desafiados para, todos os dias ao meio-dia, publicarem um capítulo de um folhetim conjunto, com textos inéditos e originais, acompanhados de trabalhos de artistas plásticos, de modo a criarem uma narrativa coletiva.
Os textos são publicados na página Bode Inspiratório, no Facebook, e divulgados pela plataforma digital Entre Vistas, onde são narrados por Paula Perfeito. São também partilhados no Instagram, em formato vídeo, narrados por Edite Queiroz.
O objetivo destes autores e artistas é, generosamente, ajudar os leitores a lidarem com o isolamento social a que a Covid-19 obrigou, através daquilo que sabem fazer melhor: escrever. A ideia, contou Ana Margarida de Carvalho ao jornal Público, “partiu da enorme ansiedade e vontade de tentar fazer alguma coisa para ajudar”.

Conheça os textos, os escritores e os artistas participantes e divulgue esta iniciativa, consultando


A leitura de um capítulo por dia, eis a sugestão que aqui deixamos.

sábado, 21 de março de 2020

Boccaccio, a Peste Negra e o Doutor Ricardo Jorge


Giovanni Boccaccio
(por Andrea del Castagno, San Godenzo 1421 - Florença, 1457)

“Já tinha chegado o ano de 1348 da fecunda encarnação do filho de Deus, quando a cidade de Florença, nobre, entre as mais famosas da Itália, foi vítima da mortal epidemia. Fosse a peste obra de influências astrais ou a consequência das nossas iniquidades e que Deus, por sua justa cólera a tivesse precipitado sobre os homens, como punição dos seus crimes, a verdade é que ela se havia declarado alguns anos antes nos países do Oriente, onde arrastara para a perda inúmeras vídas humanas. Depois, prosseguindo a sua marcha sem se deter, propagou-se, para nosso mal, na direcção do Ocidente. Todas as medidas sanitárias foram sem efeito. Por mais que os guardas especialmente encarregados disso limpassem a cidade dos montes de imundície, por mais que se proibisse a entrada a todos os doentes e se multiplicassem as prescrições de higiene, por mais que se recorresse às súplicas e às orações [...], nada deu resultado. Logo nos primeiros dias primaveris do ano a que me referi, o terrível flagelo começou, de maneira surpreendente, a manifestar as suas dolorosas devastações.
[...]
A intensidade da epidemia aumentou pelo facto de os doentes contagiarem, no seu contacto diário, os indivíduos ainda sãos, tal como o fogo quando se aproxima de uma porção de matérias secas ou gordas. E o que ainda propagou mais o desastre foi não só o facto de a prática com os doentes comunicar o mal e dar a morte às pessoas sãs, mas o simples contacto com roupas ou o que quer que fosse que os pestíferos tivessem tocado ou manejado, pois através de tais objectos logo a peste se transmitia a quem deles se servisse.
[...]
Alguns pensavam que uma vida sóbria e a abstenção de tudo o que fosse supérfluo se impunham para combater ataque tão terrível. Formavam pois a sua brigada e viviam afastados dos outros. Agrupados e reclusos em casas onde não havia doentes e onde a vida era mais agradável, usando com a maior moderação comidas delicadas e vinhos requintados, [...] não deixando ninguém falar-lhes, recusando-se a ouvir qualquer notícia vinda do exterior a respeito de mortes ou doenças, passavam o tempo a ouvir música ou entretidos com outros prazeres castos.”
Boccaccio, Decameron
(edição portuguesa traduzida por Urbano Tavares Rodrigues para o Círculo de Leitores, s. d.)

Assim é relatada a Peste Negra por Giovanni Boccaccio (Toscânia, 1313-1375), o poeta e humanista florentino que, entre 1348 e 1353, escreveu a obra Decameron, um livro estruturado em cem novelas que sete raparigas e três rapazes contaram durante dez dias. Estes dez jovens estão abrigados numa vila isolada de Florença para fugir da Peste Negra, que então afligia a cidade.
Decameron é um verdadeiro documentário acerca da epidemia que devastava o Ocidente, apresentando e caracterizando a doença e as suas manifestações, evolução e sintomas, a ineficácia da religião católica e de uma medicina quase ou totalmente impotente, as feições, os sentimentos, os costumes e as ideias da Itália do século XIV, bem como a reação das pessoas à doença e à perspectiva da morte. É considerado o primeiro livro realista da literatura, um marco na rutura entre a moral medieval, em que se valorizava o amor espiritual, e o humanismo, iniciando o registo dos valores terrenos; nele, não é mais o divino, mas a natureza que dita o móvel da conduta do homem. Nas palavras de Urbano Tavares Rodrigues, Boccaccio situou-se “entre a alma medieval moribunda e a consciência renascentista”.


Peste Negra é o nome por que ficou conhecida uma das mais devastadoras pandemias da história humana, ocorrida no século XIV e que resultou na morte de 75 a 200 milhões de pessoas. Numa época ainda distante das descobertas científicas na área da Medicina e Farmácia do século XIX, muito antes de Pasteur, Koch ou Flemming terem contribuído para a redução da mortalidade e a criação de vacinas, apenas no continente europeu estima-se que a Peste Negra tenha vitimado pelo menos um terço da população, acontecendo o pico da doença entre os anos de 1347 e 1350.
Originária das feitorias genovesas de Caffa, na Crimeia (Mar Negro), a Peste Negra chegou ao Ocidente no ano de 1347, trazida pelos mercadores que, à medida que aportavam em várias cidades europeias (cujas condições higiénico-sanitárias eram muito precárias, com ruas cheias de lixo e esgotos a céu aberto), iam contaminando as respetivas populações, espalhando-se a doença por toda a Europa até 1350.
Após esta data, e até final do século XIV, a doença permaneceu endémica em toda a Europa, manifestando-se em crises de maior violência cada dez ou quinze anos e continuando a aparecer de forma intermitente e em pequena escala até praticamente desaparecer do continente nos inícios do século XIX.
Hoje esta praga ocorre em menos de 5000 pessoas por ano em todo o mundo. Desde a década de 1990 a maioria dos novos casos surgiu no continente africano. Em 2013 foram registados 783 casos a nível mundial, contabilizando-se 126 mortes. Os três países mais endémicos são Madagascar, a República Democrática do Congo e o Peru.

A Peste Negra, causada pela bactéria Yersinia pestis, transmitida ao ser humano através das pulgas (Xenopsylla cheopis) dos ratos-pretos (Rattus rattus) ou outros roedores, é uma peste bubónica que se complica com as perturbações pulmonares e deve o seu nome ao facto de se manifestar por vómitos-negros e inchaços arroxeados (os “bubões”, tumores cutâneos) que apareciam nas virilhas e noutras partes do corpo.

Em Decameron, Bocaccio descreve os sintomas:

"Na nossa terra, no início da epidemia, quer se tratasse de homens ou de mulheres, produziam-se certos inchaços nas virilhas ou nas axilas: alguns desses inchaços tornavam-se do tamanho de uma maçã vulgar, outros como um ovo, outros um pouco maiores ou mais pequenos. Chamava-se-lhes usualmente bubões. [...] Mais tarde, os sintomas mudaram e transformaram-se em manchas negras ou lívidas que apareciam nos braços, nas coxas ou em qualquer outra parte do corpo, de umas vezes grandes e separadas, de outras muito juntas e pequenas. Tal como o bubão que fora de início, e continuava a sê-lo, o indício de uma morte certa, também as manchas o eram para aqueles em que apareciam".
In Boccaccio, Decameron
(edição portuguesa traduzida por Urbano Tavares Rodrigues para o Círculo de Leitores, s. d.)

Acreditava-se também que a doença tinha origem nos “miasmas”, o conjunto de odores fétidos provenientes de matéria orgânica em putrefação nos solos e lençóis freáticos contaminados. Por isso, na Idade Média, os chamados “médicos de peste” usavam um traje de proteção que consistia numa capa de tecido pesado, que era encerado, e numa máscara com aberturas nos olhos e um nariz em forma de cone, como um bico de ave, cheio de substâncias aromáticas e de palha. Estas máscaras foram concebidas para os proteger do ar fétido, que, de acordo com a teoria miasmática da doença, foi considerado como a causa da infecção [atualmente a teoria miasmática é considerada obsoleta, sendo consensual e aceite a teoria microbiana]. Alguns dos materiais perfumados eram folhas de hortelã, erva-cidreira, cânfora, cravo, âmbar, láudano, mirra ou pétalas de rosa. A palha fornecia um filtro para o "mau ar".


Estas roupas terão sido inventadas por Charles de Lorme, em 1619, e usadas pela primeira vez em Paris, espalhando-se mais tarde por toda a Europa. A maioria dos médicos da peste também usava um chapéu de aba, que servia para identificar a sua condição de médico, e um bastão ponteiro de madeira para examinar o paciente sem a necessidade de contacto.
Alguns especialistas defendem que a epidemia chegou ao fim graças ao ciclo natural da doença. Devido à quantidade de mortos, tornou-se mais difícil propagar a enfermidade. Além disso, muitas cidades interditaram a entrada de estrangeiros, colocaram os seus doentes em quarentena, de modo que a evitar a transmissão para outras pessoas, e obrigaram os tripulantes dos navios que chegavam aos portos a permanecer igualmente de quarentena.

Portugal
A Peste Negra chegou a Portugal no outono de 1348, durante o reinado de D. Afonso IV. Num país já fragilizado por uma série de maus anos agrícolas, terá provocado a morte de cerca de um terço a metade da população, segundo as estimativas mais credíveis, levando a nação a uma grande desorganização económica e social. O rei reagiu prontamente, tendo promulgado legislação a reprimir a mendicidade e a ociosidade, assim como Leis do Trabalho que, além de obrigarem as pessoas a trabalhar nos ofícios que desempenhavam antes da Peste e pelos anteriores salários, vão ainda normalizar práticas sociais, impondo, por exemplo, limites no tipo de vestuário ou no número de pratos que podem ser consumidos diariamente pelas diversas ordens sociais.

“Sabei que fui informado que nessa vila há homens e mulheres que, antes da peste, ganhavam dinheiro pelo seu trabalho (...) e serviam esse concelho como era necessário. E que agora, por terem recebido alguns bens por morte de algumas pessoas, consideram-se tão importantes que não querem trabalhar nos seus ofícios e serviços que antes faziam. (...)
Mando-vos, por isso, (...) que obrigueis que cada um trabalhe no ofício e nos serviços que antes fazia (...) e tabeleis os salários como vos parecer conveniente.”
(Lei de D.Afonso IV, in Livro das Leis e Posturas,
apud Ana Lídia Pinto et al., Temas de História 10, Porto: Porto Editora, 1993 - adaptado)

A Peste Negra voltou a Portugal várias vezes até ao fim do século XVII. Nenhuma foi tão devastadora como a do século XIV, mas a Grande Peste de Lisboa em 1569 terá matado 600 pessoas por dia, ao todo 60 000 habitantes da cidade terão sucumbido. Em 1899, a peste foi importada para o Porto vinda do Oriente (provavelmente de Macau, onde grassou desde 1895 até ao fim do século). A epidemia do Porto foi estudada por Ricardo Jorge, que instituiu as medidas de Saúde Pública necessárias, e que a conseguiram limitar.

Ricardo Jorge

Ricardo de Almeida Jorge nasceu no Porto, em 1858, e faleceu em Lisboa, em 1939. Foi médico, investigador, higienista, professor de Medicina e introduziu em Portugal modernas técnicas e conceitos de saúde pública.
Foi Ricardo Jorge que chegou à prova clínica e epidemiológica da peste bubónica que em 1899 assolou a cidade do Porto, tendo sido esta prova depois confirmada bacteriologicamente. As operações profiláticas que orientou no sentido de eliminar a peste, como a evacuação de casas e o isolamento e desinfeção de domicílios, entre outras, desencadearam a fúria popular que, incentivada por grupos políticos, obrigaram Ricardo Jorge a abandonar a cidade. Em Outubro de 1899 foi transferido para Lisboa, sendo nomeado Inspetor-Geral de Saúde e, depois, professor de Higiene da Escola Médico-Cirúrgica de Lisboa.
Em 1903, foi incumbido de organizar e dirigir o Instituto Central de Higiene, que passaria a ter o seu nome a partir de 1929 e hoje é o Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge.

Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge

sexta-feira, 20 de março de 2020

Começa a Primavera!

Mountain- Tribute to Kenzo Okada
Linda Cleary, 2014

Porque hoje começa a Primavera, alguns Haikai do poeta japonês Matsuo Bashô.

Já é primavera:
Uma colina sem nome
Sob a névoa da manhã.

Borboletas e
aves agitam voo:
nuvem de flores.

Quero ainda ver
nas flores no amanhecer
a face de um deus.

Chuva de flores de ameixeira
Um corvo procura em vão
o seu ninho

No perfume das flores de ameixa,
O sol de súbito surge
Ah, o caminho da montanha!

De que árvore
florida chega? Não sei.
Mas é seu perfume…

O Haiku (plural Haikai) é uma forma poética de origem japonesa que valoriza a concisão e a objetividade. Os poemas costumam ter dezassete sílabas métricas distribuídas pelos três versos (3 linhas) ou segmentos, de acordo com o cânone 5-7-5 (na tradução para português perde-se por vezes esta regra).


Matsuo Bashô (Tóquio, 1644 – Osaka, 1694) é considerado o mais famoso poeta do período Edo no Japão, reconhecido como um mestre da sucinta e clara forma haikai, codificando e estabelecendo os cânones do tradicional haiku japonês. Muitos dos seus poemas estão reproduzidos em monumentos e locais tradicionais do Japão.

terça-feira, 10 de março de 2020

Dia Internacional da Matemática



O Dia Internacional da Matemática celebra-se no dia 14 de março e comemora-se este ano pela primeira vez.
A proclamação do dia 14 de março como Dia Internacional da Matemática foi oficializada em novembro de 2019 na 40.ª sessão da Conferência Geral da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e Cultura (UNESCO), em Paris.
A efeméride já tinha sido aprovada em outubro de 2019 pelo Conselho Executivo da UNESCO, mas tinha de ser ratificada na Conferência Geral.
Até 2019, o dia 14 de março era conhecido mundialmente como o Dia do Pi. A data é escrita como 3/14 em alguns países e 3,14 é o valor aproximado de Pi.
O Dia Internacional da Matemática foi uma iniciativa da União Internacional de Matemática, organização dedicada à cooperação internacional no domínio da Matemática, e teve o apoio de várias sociedades científicas, incluindo a SPM (Sociedade Portuguesa de Matemática) e a APM (Associação de Professores de Matemática).
O ECB também se associou a esta comemoração através da colocação de diversos cartazes alusivos a diversos temas/personalidades da Matemática. Participaram na sua elaboração o Grupo Disciplinar de Matemática e os alunos das turmas do 7.º F, 8.º A, 9.º C e 9.º D nas aulas de TIC.







domingo, 8 de março de 2020

Dia Internacional da Mulher


Em 2020, o Dia Internacional da Mulher tem como tema “Eu sou a Geração Igualdade: concretizar os direitos das mulheres”.

25 anos após a Declaração e Plataforma de Ação de Pequim, adotada em 1995 na 4ª Conferência Mundial sobre as Mulheres e reconhecida como o roteiro mais progressista para o empoderamento de mulheres e meninas no mundo, a comunidade global faz um balanço dos progressos alcançados em relação aos direitos das mulheres desde a adoção da Plataforma de Ação de Pequim, crucial para o avanço da igualdade de género em todo o mundo. Apesar de alguns progressos, o consenso global emergente é de que as mudanças reais têm sido lentas para a maioria das mulheres e meninas em todo o mundo e que há uma ameaça significativa de reversão de ganhos dos direitos das mulheres duramente conquistados. Mulheres e meninas continuam subvalorizadas; trabalham mais e ganham menos, têm menos opções e experimentam múltiplas formas de violência em casa e em lugares públicos.
António Guterres, Secretário-Geral da ONU, na sua declaração sobre o Dia Internacional da Mulher 2020, afirmou

“Os direitos das mulheres fizeram um progresso significativo nas últimas décadas, da abolição de leis discriminatórias ao aumento do número de raparigas a frequentar a escola. Mas agora enfrentamos uma forte reação no sentido contrário. As proteções legais contra as violações e os abusos domésticos estão a ser diluídas em alguns países e os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres estão a ser ameaçados. Tudo isto porque a igualdade de género é fundamentalmente uma questão de poder. […] A igualdade de género é um meio de redefinir e transformar o poder que trará benefícios para todos. É hora de parar de tentar mudar as mulheres e começar a mudar os sistemas e os desequilíbrios de poder que as impedem de alcançar o seu potencial.”

Mensagem do Secretário-Geral da ONU

quarta-feira, 4 de março de 2020

EXPOSIÇÃO “Microplásticos, nos nossos rios, mares e oceanos”

Exposição fotográfica, da autoria de Filipa Bessa, investigadora do Centro de Investigação MARE - Centro de Ciências do Mar e do Ambiente, da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra. Filipa Bessa tem estudado ao longo dos anos a poluição marinha e começou a fotografar os microplásticos que encontrava nos rios, nas praias, em estômagos de peixes ou em mexilhões.

A investigadora e autora da Exposição
Filipa Bessa

Com esta Exposição, constituída por imagens ampliadas de microplásticos recolhidos no ambiente, pretende-se alertar para os seus efeitos nefastos nos ecossistemas aquáticos e despertar consciências para a problemática da poluição por (micro)plásticos nos nossos rios, mares e oceanos.



Segundo Filipa Bessa, o objetivo destas fotografias é “criar confusão” e, da forma como estão compiladas, até ao ser humano confunde. A mesma confusão que os animais marinhos “sentem em ambiente real”, quando “encontram um pedaço de plástico e o confundem com o seu próprio alimento”, acabando por ingeri-lo “de forma aleatória ou por engano”. Por isso mesmo, Filipa Bessa batizou o conjunto de fotografias de Zooplastics: “Todos os microplásticos que, de certa forma, nos fazem lembrar animais.”


Os microplásticos são fragmentos de plástico menores do que 5 milímetros. Os primários são grânulos de resinas para o fabrico de plástico. Os secundários resultam da fragmentação de plásticos de maiores dimensões, por degradação fotoquímica e abrasão. Encontram-se nas praias e no oceano à superfície, em suspensão na coluna de água, ou já depositados nos fundos. São facilmente confundidos pelos animais marinhos com alimento devido ao seu aspeto e tamanho e, por isso, são também vetores potenciais na exposição dos organismos marinhos a poluentes persistentes orgânicos de elevada toxicidade, constituindo uma ameaça para os organismos marinhos, não só pela possível obstrução mecânica do aparelho digestivo, mas também pelos efeitos tóxicos dos poluentes persistentes orgânicos.


A poluição por plásticos é atualmente um dos principais desafios ambientais com que as sociedades se deparam. Por ano, estima-se que oito milhões de toneladas de plástico terminam no Oceano e recentes projeções do Fórum Económico Mundial referem que, em 2050, poderá haver mais plásticos do que peixes nos Oceanos.



LIXO MARINHO
Considera-se lixo marinho qualquer material duradouro, fabricado ou processado que é descartado, eliminado ou abandonado na costa ou no mar. É formado por diferentes resíduos, a maioria materiais que se degradam lentamente. Mais de 80% do lixo marinho na UE é constituído por plástico, sobretudo plásticos descartáveis e artes de pesca. Tem diferentes impactos negativos quer ao nível económico (custos com limpeza das praias), quer ambiental, nomeadamente através do aprisionamento e da ingestão.

Para mais informação sobre este assunto, consultar:





domingo, 1 de março de 2020

Raul Brandão - autor do mês de março



Raul Brandão, escritor, jornalista e militar português, nasceu na Foz do Douro, Porto, a 12 de março de 1867, e morreu em Lisboa, no dia 5 de dezembro de 1930.
Descendente de pescadores, a Foz do Douro marcou de forma indelével a sua vida e obra, pelo mar e pelos seus homens.
Além de escritor, autor de uma extensa e diferenciada obra literária (ficção, teatro e livros de viagem), marcada pelas vertentes social, ética e religiosa, desenvolveu também uma carreira de jornalista (no Correio da Manhã, Revista de Hoje, Revista de Portugal, chegando a chefe de redação dos jornais O Dia e A República).
Pertenceu ao grupo dos "Nefelibatas" e à "Geração de 90" do século XIX e foi influenciado não só pelas correntes do Realismo, do Naturalismo, mas também pelo Simbolismo e o pelo Decadentismo. Foi um homem imaginativo e talentoso, mas passivo e isolado, características que, no entender de muitos estudiosos da sua vida e obra, acabaram por fazer dele, muitas vezes, um incompreendido.


Completou os primeiros estudos no Porto, cidade onde passou os anos da infância e da adolescência. No Colégio São Carlos, colaborou, em 1885, na publicação da revista escolar O Andaluz, criada "a favor das vítimas dos terramotos da Andaluzia", e na qual participaram também João de Lemos, José Leite de Vasconcelos e Trindade Coelho. Frequentou depois a Academia Politécnica do Porto, entrando então em contacto com outros jovens aspirantes a escritores, entre os quais se contava o amigo António Nobre.
Em 1888, ingressou na Escola do Exército, em Lisboa.
Em 1889, esteve na formação do grupo "Os Insubmissos" e da revista com o mesmo nome, que coordenou.
Foi em 1890 que começou a sua carreira como escritor com a publicação da coletânea de contos Impressões e Paisagens. Começou a participar ativamente em vários movimentos de renovação literária e a escrever para alguns jornais.
Em 1891, terminado o curso secundário e depois de uma breve passagem pelo Curso Superior de Letras, matriculou-se na Escola do Exército, iniciando uma carreira militar caracterizada por longas permanências no Ministério da Guerra envolvido na máquina burocrática militar. Paralelamente, manteve a carreira de jornalista e foi publicando extensa obra literária.
Raul Brandão desenvolveu, num clima visionário, uma perspetiva crítica relativamente aos valores materialistas burgueses dominantes na sociedade do seu tempo. Com uma obsessiva responsabilização ética, os seus textos, publicados a partir de 1893 no jornal Correio da Manhã, refletem um acentuado pendor ético-social e uma obsessiva interrogação sobre o sentido de um mundo sem valores, esvaziado espiritualmente, e em acelerado processo de dessacralização.
Em 1896, após concluir o estágio de 10 meses na Escola Prática de Infantaria, em Mafra, foi colocado em Guimarães, como Alferes no Regimento de Infantaria nº 20.
Em 1896, Raul Brandão publicou o livro História de um Palhaço – Vida e Diário de K. Maurício, reorganizado em 1926 com o título A Morte do Palhaço e o Mistério da Árvore.
Em março de 1897 casou-se com Maria Angelina, com quem viveu um ano em Guimarães.

Raul e Angelina Brandão pintados por Columbano Bordalo Pinheiro (1927)

Transferiu-se entretanto para o Porto, continuando a escrita a ocupar lugar importante na sua vida. Em parceria com Júlio Brandão, escreveu a peça Noite de Natal, representada no Teatro D. Maria, em 1899.
Em 1901, pediu transferência para Lisboa, onde contactou com intelectuais e anarquistas e se empenhou na carreira de jornalista.
A sua vida dividia-se entre a escrita realizada na capital e a que produzia no recolhimento da sua Casa do Alto, em Nespereira, nas proximidades de Guimarães, a qual adquirira em 1903. Nesta habitação, não se dedicava apenas à escrita, mas também à administração da propriedade. Este contacto direto com o mundo rural despertou no escritor e no homem sentimentos de comiseração e de pesar relativamente às dificuldades que marcavam a condição das comunidades agrícolas.
O tema principal da sua obra literária continuou a ser o problema de consciência perante os homens oprimidos e a análise de sentimentos contraditórios (a simpatia pelos explorados e o egoísmo de um pequeno burguês), presente pela primeira vez em Os Pobres, no início do século XX.
Reformado no posto de capitão, em 1912, inicia a fase mais fecunda da sua produção literária.
Com mais tempo para a escrita, começou a interessar-se pela História de Portugal. Compôs a obra El-rei Junot, em 1912, e redigiu A Conspiração de Gomes Freire, em 1914. Publicou O Cerco do Porto na revista "Renascença", em 1915, uma obra atribuída ao coronel Hugo Owen e Brandão, que este anotou e prefaciou.


A partir desses anos começou a passar os Invernos em Lisboa, cidade onde conviveu com os intelectuais do grupo da revista "Seara Nova" (1921), contando-se entre o grupo de fundadores deste movimento, juntamente com Jaime Cortesão, Raul Proença e Aquilino Ribeiro, entre outros.
Neste período também se dedicou à dramaturgia. Em 1923 publicou o livro Teatro, no qual compilou "O Gebo e a Sombra" (representado em 1927 no Teatro Nacional), "O Doido e a Morte" (representado em 1926 no Teatro Politeama) e "O Rei Imaginário".


Raul Brandão visitou os Açores no Verão de 1924. Dessa viagem, que durou cerca de dois meses resultou a publicação das obras As ilhas desconhecidas - Notas e paisagens (Lisboa, 1927), uma das obras que mais influíram na formação da imagem interna e externa dos Açores. É em As ilhas desconhecidas que se inspira o conhecido código de cores das ilhas açorianas: Terceira, ilha lilás; Pico, ilha negra; S. Miguel, ilha verde...



Faleceu em Lisboa, a 5 de Dezembro de 1930, aos 63 anos de idade, deixando uma extensa obra literária e jornalística. Foi sepultado no Cemitério dos Prazeres, e, em 1934, trasladado para o Cemitério de Guimarães, onde repousa até hoje.
Em 1950, a Câmara Municipal de Lisboa homenageou o escritor dando o seu nome a uma rua na zona de Alvalade. Tem uma biblioteca com o seu nome em Guimarães.

Obras publicadas
(*) no catálogo da Biblioteca do ECB

Impressões e Paisagens (1890);
História de um Palhaço (A Vida e o Diário de K. Maurício) (1896);
O Padre (1901);
A Farsa (1903) (*);
Os Pobres (1906);
El-Rei Junot (1912);
A Conspiração de 1817 (1914);
O Cerco do Porto – Pelo Coronel Owen (1915)
Húmus (1917) (*);
Memórias (vol. I), (1919) (*);
Teatro: “O Gebo e a Sombra” (*), “O Rei Imaginário” e “O Doido e a Morte” (1923);
Os Pescadores (1923) (*);
Memórias (vol. II), (1925) (*);
A pesca da baleia: e outras narrativas (1926) (*);
As Ilhas Desconhecidas (1927);
A Morte do Palhaço e o Mistério das Árvores (1926) (*);
Eu sou um Homem de Bem (monólogo teatral) (1927)
Jesus Cristo em Lisboa, em colaboração com Teixeira de Pascoaes, (1927);
O Avejão (1929) (teatro) (*);
Portugal Pequenino, em colaboração com Maria Angelina Brandão, (1930);
O Pobre de Pedir (1931);
Vale de Josafat (vol. III das Memórias), (1933).

Obras disponíveis em formato digital na Internet

Os Pobres
A Morte do Palhaço
Húmus
A Farsa
O Gebo e a Sombra
O Rei Imaginário
O Doido e a Morte
O Avejão



Os pescadores


Publicado em 1923 e dedicado à memória do avô, morto no mar, Os pescadores integra a lista do Plano Nacional de Leitura e é livro recomendado para a Formação de Adultos, como sugestão de leitura.
Nesta obra, o autor oferece-nos belas telas ricas de cor, de luz, dos vários elementos colhidos na natureza. Descendente de pescadores, o mar foi um tema recorrente da sua obra, tornando-se famoso pelo realismo das suas descrições e pelo lirismo da linguagem.
Considerada uma das mais belas obras de Raul Brandão, Os pescadores é resultado do seu conhecimento da vida do mar. Nesta obra, revela-se capaz de captar e transmitir todas as gradações da cor e da luz, oferecendo-nos belas telas dos vários elementos colhidos na Natureza. São crónicas onde se cruzam as memórias do escritor e onde comparece, de modo inigualado, o País litoral.
O entardecer nas suas várias cambiantes, conforme o lugar e o tempo, é descrito em pinceladas fortes com verbos no presente. Além de belos quadros paisagísticos, também nos oferece sugestivos retratos - o do faroleiro, a velha da Foz do Douro, a sanjoaneira, a mulher da Afurada, de Mira "feia mas esbelta (que) tem ar grave e senhoril quase sempre", a heroica Ti Ana Arneira da Gafanha, a mulher da Murtosa "baixa e atarracada", a de Ovar "delicada e forte, alta e bem proporcionada, cheia de predicados domésticos e morais", a poveira "a bem dizer - um homem", a Rata da Foz. É evidente a simpatia de Raul Brandão pela sua dolorosa vida difícil, de trabalho, de explorados.

Húmus



Publicado pela primeira vez em 1917, e dedicado ao amigo Columbano, que conheceu no final de Oitocentos e que lhe pintou dois retratos, Húmus não apresenta uma estrutura específica, oscilando entre a reflexão, notas especulativas, exercícios diarísticos e a escrita poética. A ação passa-se numa vila sem tempo e espaço, onde os personagens vivem uma existência anódina, entre o caos e a natureza. São como fantasmas grotescos e simultaneamente reais, com nomes como D. Restituta e D. Bisbórria. Todo esse jogo é relatado pelo olhar do narrador principal, Gabiru, que narra a vidas destes personagens assombrados por um tédio angustiante e opressivo.
A publicação de Húmus foi um acontecimento insólito na vida literária portuguesa, como um desses rochedos que, sem razão aparente, surgem no meio de uma planície.
O próprio Raul Brandão situou nas suas Memórias o tempo em que Húmus se inscreve: «A nossa época é horrível porque já não cremos — e não cremos ainda. O passado desapareceu, de futuro nem alicerces existem. E aqui estamos nós sem tecto, entre ruínas, à espera…»


O gebo e a sombra


Adaptado para o cinema em 2012, pelo cineasta português Manoel de Oliveira, quando este tinha 103 anos, numa produção luso-francesa que contou com a participação de grandes nomes do cinema, como Michael Lonsdale, Claudia Cardinale, Jeanne Moreau, Leonor Silveira, Luís Miguel Cintra e Ricardo Trêpa.


A peça, escrita em 1923 por Raul Brandão, é um retrato da pobreza, da honestidade e do sacrifício, um olhar sobre os paradigmas existenciais do passado e do presente, sobre Portugal e os portugueses, sobre a honra, o sonho e a esperança, oferecendo uma profunda reflexão sobre o poder do dinheiro.
Aqui encontramos a vida de Gebo (Michael Lonsdale), que, apesar de viver no limiar da pobreza, continua a sua atividade de contabilista, responsável pela recolha de dividendos de uma grande empresa, para sustentar a mulher, Doroteia (Claudia Cardinale), e Sofia, a nora (Leonor Silveira), enquanto o filho João (Ricardo Trêpa) passou quase uma década longe de casa e causou uma espécie de luto na mãe. A existência daquelas três pessoas é triste e monótona, girando à volta da ausência de João, que ninguém sabe onde está ou as razões por que partiu. Apesar de o velho Gebo tentar encontrar maneiras de aliviar o sofrimento das duas mulheres, ocultando de Doroteia a vida de roubos que o filho comete, parece que nada consegue minimizar as suas dores, até que João misteriosamente regressa à vida da família e é a partir deste regresso que o equilíbrio familiar, já de si frágil, se rompe, dando origem a uma catástrofe.