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terça-feira, 3 de dezembro de 2019

O Fantasma de Canterville, de Oscar Wilde: uma recriação artística pelos alunos do 7º ano



O Fantasma de Canterville, a primeira história publicada pelo escritor irlandês Oscar Wilde (Dublin, Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda, 16 de outubro de 1854 — Paris, 30 de novembro de 1900), leva-nos a um castelo assombrado, adquirido por uma abastada família americana que não acredita no sobrenatural, obrigando o pobre fantasma residente a encetar uma série de estratagemas para assustar os seus novos hóspedes.
Uma obra de leitura recomendada e referenciada no Plano Nacional de Leitura para o Ensino Básico, que, entre o fantástico, o terror e a comédia, nos diverte e leva a refletir sobre os valores mais elevados da vida.






Em 2014, a Editora Lusoreads, a primeira editora especializada na publicação de livros de Leitura Fácil em português, iniciou a sua atividade com a publicação de O Fantasma de Canterville. Esta editora, criada com o objetivo de dar resposta às necessidades diferenciadas dos leitores e assegurar uma oportunidade real de leitura para todos, propõe adaptações à Leitura Fácil, permitindo que pessoas com dificuldades de aquisição de leitura ou níveis baixos de literacia possam aceder aos mesmos livros que os restantes leitores e ser atendidos na diversidade através da inclusão.


Exemplo de uma página de um livro em versão adaptada:


domingo, 1 de dezembro de 2019

José Rodrigues Miguéis - autor do mês de dezembro



José Rodrigues Miguéis nasceu em Lisboa, no dia 9 de dezembro de 1901, e morreu em Nova Iorque, no dia 27 de outubro de 1980.
Licenciado em Direito, pela Universidade de Lisboa, em 1924, e em Ciências Pedagógicas, pela Universidade Livre de Bruxelas, em 1933, foi temporariamente advogado, delegado do Ministério Público e professor do ensino secundário. Mas foi como romancista, novelista, contista, dramaturgo, desenhador e cronista que se destacou no panorama cultural português, apesar de ainda hoje ser ignorado pela maior parte do público (ou talvez não reconhecido como mereceria).
Foi colaborador de diversos jornais como O Diabo, Diário Popular, Diário de Lisboa e República, dirigiu com Bento de Jesus Caraça o semanário O Globo (que viria a ser proibido pela censura em 1933), pertenceu ao grupo Seara Nova ao lado de autores como Jaime Cortesão, António Sérgio, José Gomes Ferreira, Irene Lisboa ou Raul Proença, e envolveu-se em movimentos de intervenção cívica democrática, o que lhe valeu ver o seu nome censurado nos jornais e a ida para os EUA em 1935, onde acabou por se fixar e viver a maior parte da sua vida, recebendo, em 1942, a nacionalidade americana. Nos Estados Unidos trabalhou como tradutor, redator e editor assistente das Seleções do Reader's Digest e professor universitário. Traduziu para o português, entre outros, autores como Stendhal, Carson McCullers, Erskine Caldwell ou F. Scott Fitzgerald.
A sua obra, iniciada em 1932 com a publicação da novela Páscoa Feliz, enquadra-se predominantemente na ficção narrativa e na crónica-ensaio e encontra-se marcada pela experiência autobiográfica, da infância e juventude passadas em Lisboa, mas também pela condição de emigrante, nomeadamente na Bélgica, e de expatriado nos Estados Unidos.

Em 1935, publicou no jornal O Diabo o primeiro conto neorrealista da literatura portuguesa, intitulado «O Acidente» (que viria a integrar o volume de contos Onde a Noite se Acaba, publicado em 1946). No entanto, apesar de parecem claras nas suas primeiras obras as influências estéticas da geração da Presença, e alguma simpatia pelas temáticas neorrealistas, José Rodrigues Miguéis nunca seguiu o cânone rígido nem do neorrealismo, nem do presencismo, situando-se numa zona de intersecção entre ambos os movimentos literários, gerando sínteses originais.
Segundo os professores António José Saraiva e Óscar Lopes, a sua obra pode ser considerada como “realismo ético”, um realismo simultaneamente pessoal e consciente da sua responsabilidade ética e social, o que confere ao escritor um espaço único na ficção realista contemporânea, sendo claras as influências de autores como Dostoiévsky ou Raul Brandão.
São seis os romances de José Rodrigues Miguéis: Uma Aventura Inquietante (1958, considerado o primeiro romance policial português, anos antes publicado em folhetins, no jornal O Diabo), A Escola do Paraíso (1960), Nikalai! Nikalai! (1971), O Milagre segundo Salomé (1975), O Pão Não Cai do Céu (1981), Idealista no Mundo Real (1986). Mas foi na novela e no conto que este autor se tornou uma referência obrigatória: Páscoa Feliz (1932) – Prémio da Casa da Imprensa ou Léah e Outras Histórias (1958) - Prémio Camilo Castelo Branco – estão incluídos entre os melhores no género.










Em 1961 foi eleito membro da Hispanic Society of America e, em 1976, tornou-se membro da Academia das Ciências de Lisboa.
Uma parte da obra de José Rodrigues Miguéis encontra-se traduzida em inglês, italiano, alemão, polaco, checo e russo.

Morreu na cidade de Nova Iorque, no dia 27 de outubro de 1980.

Obra literária

(*) – no catálogo da Biblioteca do ECB
A Múmia, 1971;
Páscoa feliz (Novela), 1932 (*)
Onde a noite se acaba (Contos e Novelas), 1946
Saudades para Dona Genciana (Conto), 1956
O Natal do clandestino (Conto), 1957
Uma aventura inquietante (Romance), 1958 (*)
Léah e outras histórias (Contos e Novelas), 1958 (*)
Um homem sorri à morte com meia cara (Narrativa), 1959
A escola do paraíso (Romance), 1960 (*)
O passageiro do Expresso (Teatro), 1960
Gente da terceira classe (Contos e Novelas), 1962 (*)
É proibido apontar. Reflexões de um burguês - I (Crónicas), 1964
Nikalai! Nikalai! (Romance), 1971 (*)
O espelho poliédrico (Crónicas), 1972
Comércio com o inimigo (Contos), 1973
As harmonias do "Canelão". Reflexões de um burguês - II (Crónicas), 1974
O milagre segundo Salomé, 2 vols. (Romance), 1975 (*)
O pão não cai do céu (Romance), 1981 (*)
Passos confusos (Contos), 1982 (*)
Arroz do céu (Conto), 1983 (*)
O Anel de Contrabando, 1984
Uma flor na campa de Raul Proença, 1985
Idealista no mundo real, 1991
Aforismos & desaforismos de Aparício, 1996


Na Biblioteca do ECB encontram-se ainda as traduções que José Rodrigues Miguéis fez de:
  • O grande Gatsby, de F. Scott Fitzgerald
  • Uma luz ao escurecer, de Erskine Caldwell

Referências bibliográficas:

Saraiva, António José e Lopes, Óscar – História da literatura portuguesa. Porto: Porto, 1987

Consultar também:



Documentário biográfico “José Rodrigues Miguéis — Um homem do povo na história da República.”, realizado em 1998 por Diana Andringa, com a participação de Camille Miguéis (viúva do escritor), Eduardo Lourenço, Mécia de Sena, Teresa Mourão-Ferreira, Pilar Ribeiro, Baptista Bastos, George Monteiro, Gerald Moser, Maria de Sousa, Onésimo Teotónio Almeida e Teresa Martins Marques.



domingo, 24 de novembro de 2019

Dia Mundial da Ciência - Poema para Galileu



Estou olhando o teu retrato, meu velho pisano,
aquele teu retrato que toda a gente conhece,
em que a tua bela cabeça desabrocha e floresce
sobre um modesto cabeção de pano.
Aquele retrato da Galeria dos Ofícios da tua velha Florença.
(Não, não, Galileo! Eu não disse Santo Ofício.
Disse Galeria dos Ofícios.)
Aquele retrato da Galeria dos Ofícios da requintada Florença.
Lembras-te? A Ponte Vecchio, a Loggia, a Piazza della Signoria…
Eu sei… eu sei…
As margens doces do Arno às horas pardas da melancolia.
Ai que saudade, Galileo Galilei!
Olha. Sabes? Lá em Florença
está guardado um dedo da tua mão direita num relicário.
Palavra de honra que está!
As voltas que o mundo dá!
Se calhar até há gente que pensa
que entraste no calendário.
Eu queria agradecer-te, Galileo,
a inteligência das coisas que me deste.
Eu,
e quantos milhões de homens como eu
a quem tu esclareceste,
ia jurar- que disparate, Galileo!
- e jurava a pés juntos e apostava a cabeça
sem a menor hesitação-
que os corpos caem tanto mais depressa
quanto mais pesados são.
Pois não é evidente, Galileo?
Quem acredita que um penedo caia
com a mesma rapidez que um botão de camisa ou que um seixo da praia?
Esta era a inteligência que Deus nos deu.
Estava agora a lembrar-me, Galileo,
daquela cena em que tu estavas sentado num escabelo
e tinhas à tua frente
um friso de homens doutos, hirtos, de toga e de capelo
a olharem-te severamente.
Estavam todos a ralhar contigo,
que parecia impossível que um homem da tua idade
e da tua condição,
se tivesse tornado num perigo
para a Humanidade
e para a Civilização.
Tu, embaraçado e comprometido, em silêncio mordiscavas os lábios,
e percorrias, cheio de piedade,
os rostos impenetráveis daquela fila de sábios.
Teus olhos habituados à observação dos satélites e das estrelas,
desceram lá das suas alturas
e poisaram, como aves aturdidas- parece-me que estou a vê-las -,
nas faces grávidas daquelas reverendíssimas criaturas.
E tu foste dizendo a tudo que sim, que sim senhor, que era tudo tal qual
conforme suas eminências desejavam,
e dirias que o Sol era quadrado e a Lua pentagonal
e que os astros bailavam e entoavam
à meia-noite louvores à harmonia universal.
E juraste que nunca mais repetirias
nem a ti mesmo, na própria intimidade do teu pensamento, livre e calma,
aquelas abomináveis heresias
que ensinavas e descrevias
para eterna perdição da tua alma.
Ai Galileo!
Mal sabem os teus doutos juízes, grandes senhores deste pequeno mundo
que assim mesmo, empertigados nos seus cadeirões de braços,
andavam a correr e a rolar pelos espaços
à razão de trinta quilómetros por segundo.
Tu é que sabias, Galileo Galilei.
Por isso eram teus olhos misericordiosos,
por isso era teu coração cheio de piedade,
piedade pelos homens que não precisam de sofrer, homens ditosos
a quem Deus dispensou de buscar a verdade.
Por isso estoicamente, mansamente,
resististe a todas as torturas,
a todas as angústias, a todos os contratempos,
enquanto eles, do alto incessível das suas alturas,
foram caindo,
caindo,
caindo,
caindo,
caindo sempre,
e sempre,
ininterruptamente,
na razão direta do quadrado dos tempos.
António Gedeão
(pseudónimo de Rómulo Vasco da Gama de Carvalho, químico, professor de físico-química do ensino secundário no Liceu Pedro Nunes e Liceu Camões, investigador de História da ciência e poeta, nascido em Lisboa a 24 de novembro de 1906 e falecido na mesma cidade a 19 de fevereiro de 1997)

Dia Mundial da Ciência



No dia 24 de novembro celebra-se o Dia Mundial da Ciência, com o objetivo de reconhecer o papel da ciência para o desenvolvimento humano, colocar desafios para o futuro, destacar grandes nomes da ciência e fomentar o gosto pela ciência nas gerações mais novas.
Foi no dia 24 de novembro de 1859 que foi publicada a primeira edição do livro A Origem das Espécies, de Charles Darwin, pela editora de John Murray, em Londres, com uma tiragem de 1250 exemplares, que se esgotaram no mesmo dia.




Em Portugal, este é também o dia dedicado à Cultura Científica, em homenagem ao professor Rómulo de Carvalho, responsável pela promoção do ensino de ciência e da cultura científica em Portugal e que nasceu a 24 de novembro de 1906. Rómulo de Carvalho foi também poeta, sob o pseudónimo de António Gedeão.


As turmas C e D do 7º ano, na disciplina de Física e Química, realizaram na Biblioteca um trabalho de pesquisa sobre a vida e a obra de Galileu Galilei. Uma parte desse trabalho pode ser vista na nossa montra.






quinta-feira, 21 de novembro de 2019

Dia Mundial da Filosofia


Mensagem de Audrey Azoulay, Diretora-Geral da UNESCO, por ocasião do Dia Mundial da Filosofia (2019):

“A Filosofia nasceu do nosso assombro pelo mundo e pela nossa existência”. Existem várias definições de filosofia, mas a de Arthur Schopenhauer, na sua obra-prima O Mundo como Vontade e Representação, é talvez uma das mais brilhantes.
A filosofia consistiria assim numa busca perpétua do questionamento que, em vez de ver o mundo como uma certeza, o vê antes como uma interrogação. Através do seu gosto por paradoxos, do seu constante questionamento dos preconceitos, a filosofia é um convite para pensar o mundo em toda a sua riqueza e complexidade.
Esta habilidade para o assombro remonta a uma tradição milenar, que surgiu há mais de 3 mil anos na China, no Médio Oriente e na Grécia Antiga; mas, apesar do seu caráter ancestral, o questionamento filosófico em nada perdeu a sua atualidade.
Num momento em que o extremismo e a rapidez das grandes transformações do mundo por vezes nos confundem, a filosofia é extremamente útil. Permite-nos distanciarmo-nos e, simultaneamente, e vermos mais além, observarmos o horizonte sem perdermos de vista o presente.
A revolução da inteligência artificial, em particular, é um terreno propício ao questionamento filosófico. Como conciliar tecnologia e humanidade? Como garantir uma ética da ciência? Estes questionamentos, tradicionais no domínio da filosofia ética ou científica, estão a encontrar um novo eco neste início do século XXI.
A filosofia é uma ferramenta valiosa para refletirmos sobre a mudança; é também uma abordagem que promove o diálogo e a tolerância. Ler as obras de Chuang-Tzu, o pai do Taoismo, Nagarjuna, o virtuoso dialético do Budismo, Avicena, o médico e filósofo, Moisés Maimónides, o filósofo Talmudista, ou Hannah Arendt e Simone Weil, é tomar consciência da universalidade dos seus questionamentos e envolver-se num exercício propício à abertura, à tolerância e in fine à paz entre os povos.
Por todos estes motivos, a UNESCO sempre alentou a filosofia. A UNESCO é uma instituição que põe em prática um projeto filosófico – a filosofia dos direitos humanos que foi a de Emmanuel Kant ou de Bernadin de Saint-Pierre. De certa forma, pode dizer-se que a UNESCO, cujo mandato reflete a vocação universal da filosofia, é ela própria uma filosofia.
Neste Dia Mundial da Filosofia, a UNESCO convida-vos também a experimentar este assombro pelo mundo e pelo ambiente, a desmascarar os dogmas e os preconceitos, em suma, a descobrir a universalidade da
condição humana.”
https://www.unescoportugal.mne.pt/pt/noticias/mensagem-de-audrey-azoulay-diretora-geral-da-unesco-por-ocasiao-do-dia-mundial-da-filosofia-2019

Em 2002, a UNESCO instituiu o Dia Mundial da Filosofia, por acreditar no valor da filosofia para o desenvolvimento do pensamento humano em cada cultura e cada indivíduo, sustentando que o pensamento crítico ajuda a dar sentido à vida e às ações realizadas no contexto internacional. Este dia é desde então comemorado todos os anos na terceira quinta-feira de novembro. O objetivo do dia é enaltecer a importância da Filosofia (ou o amor pela sabedoria) na vida do homem e na vida em sociedade. Este pretende ser um dia também para reflexão sobre acontecimentos atuais, fomentando-se o pensamento crítico, criativo e independente, contribuindo assim para a promoção da tolerância e da paz.

Para assinalar o Dia Mundial da Filosofia no Externato Cooperativo da Benedita, o grupo de Filosofia, em articulação com o Plano Nacional de Cinema, propuseram aos alunos do ensino secundário o visionamento do filme Ágora, realizado por Alejandro Amenábar em 2009, e que retrata a vida excecional de Hipátia de Alexandria, uma filósofa grega do Egito Romano que viveu entre c. 351/370 e 415, a primeira mulher documentada como tendo sido matemática.



Filha de Téon de Alexandria, um conceituado filósofo, astrónomo, matemático, autor de diversas obras e professor em Alexandria, Hipátia foi criada num ambiente de ideias e filosofia, que lhe permitiu desenvolver uma forte paixão pela busca de respostas para o desconhecido. Hipátia estudou na Academia de Alexandria, onde devorava conhecimento: matemática, astronomia, filosofia, religião, poesia e artes. A oratória e a retórica também não foram descuidadas, pelo que era grande a sua habilidade para falar em público, destacando-se como professora na Academia onde fizera a maior parte dos estudos. Sabemos que desenvolveu estudos sobre Álgebra e que o seu contributo para a ciência incluiu o mapeamento dos corpos celestes, já antes realizado pelos mesopotâmicos e também por Ptolomeu, matemático, e astrónomo grego, que viveu em Alexandria entre os anos 90 e 168. Em parceria com o pai, terá escrito vários ensaios, entre os quais um tratado sobre Euclides. Aos 30 anos já era diretora da Academia de Alexandria, sendo muitas as obras que terá escrito nesse período, embora a maior parte do seu trabalho tenha desaparecido (quer com a destruição final da Biblioteca de Alexandria, no século VII, quer devido à pouca importância que se dava ao trabalho académico das mulheres neste período da História).

Alexandria, cidade fundada por Alexandre o Grande, em 331 a.C, e que se converteu rapidamente num centro de cultura e aprendizagem no mundo antigo, era um lugar onde pagãos, judeus e cristãos partilhavam o mesmo espaço. Foi este conflito religioso que decidiu o destino de Hipatia.
De acordo com a única fonte contemporânea, Hipátia foi assassinada por uma multidão de cristãos depois de ser acusada de exacerbar um conflito entre duas figuras proeminentes em Alexandria: o governador Orestes e Cirilo, o bispo de Alexandria.
O seu fim trágico começou a desenhar-se em 412, quando Cirilo foi nomeado Patriarca de Alexandria, título de dignidade eclesiástica, usado em Constantinopla, Jerusalém e Alexandria. Cristão fervoroso, Cirilo lutou toda a vida em nome da ortodoxia da Igreja e combateu as heresias, sobretudo o Nestorianismo, que negava a divindade de Jesus Cristo e a maternidade divina de Maria. A eventual relação de Cirilo com a morte de Hipatia continua a ser motivo de alguma controvérsia entre os historiadores. As últimas pesquisas creem que o homicídio de Hipátia resultou do conflito entre duas fações cristãs: uma mais moderada, ao lado de Orestes, e outra mais rígida, seguidora de Cirilo, responsável pelo ataque.
De acordo com o relato de Sócrates Escolástico (também conhecido como Sócrates de Constantinopla, historiador grego da igreja cristã, que viveu entre o século IV e o século V), numa tarde de março de 415, quando regressava do Museu, Hipátia foi atacada em plena rua por uma turba de cristãos enfurecidos, que a acusavam de paganismo e bruxaria. Foi arrastada pelas ruas da cidade até uma igreja, onde foi cruelmente torturada até à morte. Depois de morta, o corpo foi lançado a uma fogueira.

Alguns historiadores defendem que o assassinato de Hipátia marcou a queda da vida intelectual em Alexandria e o fim da Antiguidade Clássica.

“Em que acreditas?”, perguntam-lhe os seus perseguidores cristãos antes de a desfazerem. “Na Filosofia”, respondeu, firme.

sexta-feira, 1 de novembro de 2019

Novembro - o mês de SOPHIA


Comecei a escrever numa noite de Primavera, uma incrível noite de vento leste e Junho. Nela o fervor do universo transbordava e eu não podia reter, cercar, conter – nem podia desfazer-me em noite, fundir-me na noite. (...)
[Anotação no primeiro poema escrito por Sophia, «Primeira noite de Verão»]

Sophia de Mello Breyner Andresen nasceu no Porto, a 6 de novembro de 1919, e morreu em Lisboa, a 2 de Julho de 2004. Foi a primeira mulher portuguesa a receber o mais importante galardão literário da língua portuguesa, o Prémio Camões, em 1999. Foram-lhe concedidas honras de Estado e os seus restos mortais foram trasladados para o Panteão Nacional, em 2014.
Além de escritora, Sophia distinguiu-se também pela sua atitude interventiva, tendo denunciado ativamente o regime salazarista e os seus seguidores. Apoiou a candidatura do general Humberto Delgado e fez parte dos movimentos católicos contra o Estado Novo. Ficou célebre como canção de intervenção dos Católicos Progressistas a sua "Cantata da Paz", também conhecida e chamada pelo seu refrão: "Vemos, Ouvimos e Lemos. Não podemos ignorar!".
Em 1975, após o 25 de Abril, foi eleita para a Assembleia Constituinte.

Sophia de Mello Breyner Andresen fez-se poeta ainda na infância, depois de, com apenas três anos, a sua ama Laura lhe ter ensinado "A Nau Catrineta". Disse numa entrevista (concedida a Maria Armanda Passos, "Sophia, um retrato", in Jornal de Letras, nº 26, Fevereiro de 1982)
"Havia em minha casa uma criada, chamada Laura, de quem eu gostava muito. Era uma mulher jovem, loira, muito bonita. A Laura ensinou-me a "Nau Catrineta" porque havia um primo meu mais velho a quem tinham feito aprender um poema para dizer no Natal e ela não quis que eu ficasse atrás… Fui um fenómeno, a recitar a "Nau Catrineta", toda. Mas há mais encontros, encontros fundamentais com a poesia: a recitação da "Magnífica", nas noites de trovoada, por exemplo. Quando éramos um pouco mais velhos, tínhamos uma governanta que nessas noites queimava alecrim, acendia uma vela e rezava. Era um ambiente misto de religião e magia… E de certa forma nessas noites de temporal nasceram muitas coisas. Inclusivamente, uma certa preocupação social e humana ou a minha primeira consciência da dureza da vida dos outros, porque essa governanta dizia: «Agora andam os pescadores no mar, vamos rezar para que eles cheguem a terra» (…)."

Começou a escrever poesia aos 12 anos, e aos 25 (em 1944), lançou o seu primeiro livro – Poesia -, uma coletânea de poemas que escrevera até então, numa edição de 300 exemplares financiada pelo seu pai.




O real, concreto da Natureza marcou profundamente a sua obra. Era para Sophia um exemplo de liberdade, beleza, perfeição e de mistério. A Natureza é largamente citada em toda a sua obra, quer pelas alusões à terra (árvores, pássaros, o luar), quer pelas referências ao mar (praia, conchas, ondas), que é um dos conceitos-chave na sua criação literária. O mar da praia da Granja, em Espinho, onde passava férias na infância e juventude; o mar da praia de Dona Ana, em Lagos, para onde começou a ir com os filhos ainda pequenos.


Na praia de Dona Ana, em Lagos

Outro dos temas marcantes da obra de Sophia é a Grécia: a geografia, o Mediterrâneo, a luz, o ritmo, as ilhas; a Grécia primordial enquanto mito e literatura fundadora. Se desde os seus estudos de Filologia Clássica na Universidade de Lisboa (curso que não chegou a concluir) se fazia sentir em Sophia a influência da cultura da Grécia Antiga, foi sobretudo durante as suas viagens pelo Mediterrâneo (a primeira das quais em 1963, com Agustina Bessa-Luís), que a Grécia se tornou uma paixão e uma referência.

Foi no mar que aprendi o gosto da forma bela
Ao olhar sem fim o sucessivo
Inchar e desabar da vaga
A bela curva luzidia do seu dorso
O longo espraiar das mãos de espuma
Por isso nos museus da Grécia antiga
Olhando estátuas frisos e colunas
Sempre me aclaro mais leve e mais viva
E respiro melhor como na praia.
“Foi no mar que aprendi”, de O Búzio de Cós (1997)


Na Grécia, com Agustina Bessa Luís (1963)

Nos seus versos encontramos Orfeu e Eurydice, Dionísos, Endemyion, Electra, Ariadne, Antínoo, ou as Parcas; encontramos Creta e a cidade de Cnossos, Delfos ou Ítaca, lugares de encantamento para Sophia por representarem um mundo original ao qual tende regressar.


Na Grécia (1988)

A sua obra, que se divide essencialmente entre a poesia (publicou cerca de 20 obras, entre 1944 e 2001) e a literatura infantil, com 8 títulos publicados, está traduzida em várias línguas e foi várias vezes premiada, tendo recebido, entre outros, o Prémio Camões 1999, o Prémio Poesia Max Jacob 2001 e o Prémio Rainha Sofia de Poesia Ibero-Americana – a primeira vez que um português venceu este prestigiado galardão. Distinguiu-se também como autora de peças de teatro e de ensaios. Traduziu Eurípedes, Shakespeare, Claudel, Dante e, para o francês, alguns poetas portugueses.



Sophia de Mello Breyner Andresen faleceu aos 84 anos, no dia 2 de Julho de 2004, em Lisboa. A 2 de julho de 2014, o seu corpo foi transladado para o Panteão Nacional – foi a segunda mulher lá sepultada (a primeira foi a fadista Amália Rodrigues). Contudo, a memória que nos fica de Sophia é, sobretudo, a de uma mulher que amou a natureza, o mundo, as palavras e o seu poder de transformá-lo. Durante a cerimónia de transladação, Rita Sousa Tavares, sua neta, recordou aquele que foi um dos seus grandes amores – o mar –, ao qual a autora dedicou inúmeros poemas: “Se lhe dessem a escolher entre um prémio literário e um último mergulho no mar, preferia o mergulho no mar”.

Dois filmes sobre Sophia a não perder:
Sophia de Mello Breyner Andresen, realizado por João César Monteiro, em 1969


O Nome das Coisas, documentário sobre a vida e a obra da poetisa Sophia de Mello Breyner Andresen, numa aproximação ao seu universo muito pessoal produzida com base em depoimentos de familiares e amigos, e em documentação fotográfica. Realizado por Pedro Clérigo para a RTP.


Obras
(*) Disponíveis na Biblioteca do ECB
Poesia
  • Poesia (1944, Cadernos de Poesia, nº 1, Coimbra) (*)
  • O Dia do Mar (1947, Lisboa, Edições Ática) (*)
  • Coral (1950, Porto, Livraria Simões Lopes)
  • No Tempo Dividido (1954, Lisboa, Guimarães Editores) (*)
  • Mar Novo (1958, Lisboa, Guimarães Editores) (*)
  • Livro Sexto (1962, Lisboa, Livraria Morais Editora) (*)
  • O Cristo Cigano (1961, Lisboa, Minotauro, ilustrado por Júlio Pomar) (*)
  • Geografia (1967, Lisboa, Ática) (*)
  • Grades (1970)
  • 11 Poemas (1971)
  • Dual (1972, Coimbra Moraes Editores) (*)
  • Antologia (1975) (*)
  • O Nome das Coisas (1977, Lisboa, Moraes Editores)
  • Navegações (1983) (*)
  • Ilhas (1989) (*)
  • Musa (1994) (*)
  • Signo (1994)
  • O Búzio de Cós (1997) (*)
  • Mar (2001) - antologia organizada por Maria Andresen de Sousa Tavares
  • Primeiro Livro de Poesia (infanto-juvenil) (1999) (*)
  • Orpheu e Eurydice (2001) (*)




Poemas não incluídos na Obra Poética
  • "Juro que venho para mentir"; "És como a Terra-Mãe que nos devora"; "O mar rolou sobre as suas ondas negras"; "História improvável"; "Gráfico", Távola Redonda - Folhas de Poesia, nº 7, Julho, 1950.
  • "Reza da manhã de Maio"; "Poema", A Serpente - Fascículos de Poesia, nº 1, Janeiro, 1951.
  • "Caminho da Índia", A Cidade Nova, suplemento dos nº 4-5, 3.ª série, Coimbra, 1958.
  • "A viagem" [Fragmento do poema inédito "Naufrágio"], A Cidade Nova, 5.ª série, nº 6, Dezembro, 1958.
  • "Novembro"; "Na minha vida há sempre um silêncio morto"; "Inverno", Fevereiro - Textos de Poesia, 1972.
  • "Brasil 77", Loreto 13 - Revista Literária da Associação Portuguesa de Escritores, nº 8, Março, 1982.
  • "A veste dos fariseus", Jornal dos Poetas e Trovadores - Mensário de Divulgação Cultural, nº 5/6, 2.ª série, Março/Abril, 1983.
  • "Oblíquo Setembro de equinócio tarde", Portugal Socialista, Janeiro, 1984.
  • "Canção do Amor Primeiro", Sete Poemas para Júlio (Biblioteca Nacional, cota nº L39709), 1988.
  • "No meu Paiz", Escritor, nº 4, 1995.
  • "D. António Ferreira Gomes. Bispo do Porto"; "Naquele tempo" ["Dois poemas inéditos"], Jornal de Letras, 16 Jun., 1999.

Ficção
Contos
  • A Menina do Mar (1958) (*)
  • A Fada Oriana (1958) (*)
  • A Noite de Natal (1959) (*)
  • Contos Exemplares (1962, Lisboa, Livraria Morais Editora) (*)
  • O Cavaleiro da Dinamarca (1964) (*)
  • O Rapaz de Bronze (1966) (*)
  • A Floresta (1968) (*)
  • O Tesouro (1970)
  • A Árvore (1985) (*)
  • Histórias da Terra e do Mar (1984, Lisboa, Edições Salamandra) (*)
  • Contos Infantis










Teatro
  • O Bojador (2000, Lisboa, Editorial Caminho)
  • O Colar (2001, Lisboa, Editorial Caminho) (*)
  • O Azeiteiro (2000, Lisboa, Editorial Caminho)
  • Filho de Alma e Sangue (1998, Lisboa, Editorial Caminho)
  • Não chores minha Querida (1993, Lisboa, Editorial Caminho)


Ensaio
  • "A poesia de Cecíla Meyrelles" (1956), Cidade Nova, 4.ª série, nº 6, Novembro 1956
  • Cecília Meyrelles (1958), in Cidade Nova
  • Poesia e Realidade (1960), in Colóquio: Revista de Artes e Letras, nº 8
  • "Hölderlin ou o lugar do poeta" (1967), Jornal de Comércio, 30 de Dez. 1967.
  • O Nu na Antiguidade Clássica (1975), in O Nu e a Arte, Estúdios Cor
  • "Torga, os homens e a terra" (1976), Boletim da Secretaria de Estado da Cultura, Dezembro 1976
  • "Luiz de Camões. Ensombramentos e Descobrimentos" (1980), Cadernos de Literatura, nº 5
  • "A escrita (poesia)", (1982/1984), Estudos Italianos em Portugal, nº 45/47

Traduções de Sophia de Mello Breyner Andresen
  • A Anunciação de Maria (Paul Claudel) – 1960, Lisboa, Editorial Aster
  • O Purgatório (Dante) – 1962, Lisboa, Minotauro
  • "A Hera", "A última noite faz-se estrela e noite" (Vasko Popa); "Às cinzas", "Canto LI", "Canto LXVI" (Pierre Emmanuel); "imagens morrendo no gesto da", "Gosto de te encontrar nas cidades estrangeiras" (Edouard Maunick), O Tempo e o Modo, nº 22 - 1964
  • Muito Barulho por Nada (William Shakespeare) - 1964
  • Medeia (Eurípedes) - 1964
  • Hamlet (William Shakespeare) – 1965
  • "Os Reis Magos", tradução de um poema do Eré Frene – 1967.
  • Quatre Poètes Portugais (Camões, Cesário Verde, Mário de Sá-Carneiro, Fernando Pessoa) – 1970
  • A Vida Quotidiana no Tempo de Homero, de Émile Mireaux, Lisboa, [1979] (*)
  • Ser Feliz, de Leif Kristianson, 1980
  • Um Amigo, de Leif Kristianson, 1981
  • Medeia, de Eurípedes (inédito) [199-] (*)
Prémios
1964 - Grande Prémio de Poesia da Sociedade Portuguesa de Escritores, atribuído a Livro Sexto.
1977 - Prémio Teixeira de Pascoaes
1979 – Medalha de Verneil da Societé de Encouragement au Progrés, de França
1983 - Prémio da Crítica, do Centro Português da Associação Internacional de Críticos Literários, pelo conjunto da sua obra
1989 - Prémio D. Dinis, da Fundação da Casa de Mateus
1990 - Grande Prémio de Poesia Inasset / Inapa; Prémio P.E.N. Clube Português de Poesia
1992 - Grande Prémio Calouste Gulbenkian de Literatura para Crianças
1993 - Grande Prémio Vida Literária APE/CGD
1995 - Prémio Petrarca Associação de Editores Italianos
1995 – Homenagem de Faculdade de Teologia da Universidade Católica de Lisboa, pelo cinquentenário da publicação do primeiro livro Poesia
1995 - Outubro – Placa de Honra do Prémio Francesco Petrarca, Pádua, Itália
1996 - Homenageada do Carrefour des Littératures, na IV Primavera Portuguesa de Bordéus e da Aquitânia
1998 - Prémio da Fundação Luís Miguel Nava
1999 - Prémio Camões
2000 - Prémio Rosalia de Castro, do Pen Clube Galego
2001 - Prémio Max Jacob Étrange
2003 - Prémio Rainha Sophia de Poesia Ibero-americana.

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