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terça-feira, 31 de outubro de 2017

O fantasma dos Canterville, de Oscar Wilde


“- Não durmo há trezentos anos – disse, tristemente, e Virgínia abriu os seus lindos olhos de espanto; - há trezentos anos que não durmo e estou tão cansado!”
Virgínia ficou muito séria e tremeram-lhe os lábios como pétalas de rosa. Chegou-se ao pé dele e, ajoelhando ao seu lado, olhou para o seu velho rosto embranquecido.
“- Meu pobre Fantasma! - murmurou. Não tem sítio onde possa dormir?”
“-Para além dos pinhais - respondeu numa voz baixa e sonhadora - há um jardim. As ervas crescem aí muito, há aí as grandes flores brancas de cicuta e o rouxinol canta pela noite fora. Pela noite fora canta ele e a lua fria e cristalina olha para baixo e o teixo estende os seus braços gigantescos sobre os que dormem.
Os olhos de Virgínia encheram-se de lágrimas e escondeu o rosto nas mãos.
“- Está a falar do Jardim da Morte – disse ela baixinho.
“- Sim, da Morte. A morte deve ser tão linda! Deitar-se na terra macia e castanha com as ervas a acenar por cima das nossas cabeças e a ouvir o silêncio. Nem ontem nem amanhã. Esquecer o tempo, esquecer a morte, estar em paz. Você pode ajudar-me. Pode abrir-me os portais da Morte da casa, pois o Amor está em si e o Amor é mais forte do que a Morte.
Virgínia estremeceu, correu por um momento um calafrio por ela abaixo e houve um silêncio de alguns minutos. Parecia-lhe estar num sonho horrível.
Então o Fantasma voltou a falar e a sua voz parecia um gemido do vento.
“- Já alguma vez leu a velha profecia que está na vidraça da biblioteca?”
“- Ah Muitas vezes! – exclamou a rapariga, e levantou a cabeça. – Conheço-a muito bem. Está pintada numas letras pretas muito estranhas e é difícil de ler. São só seis versos:
Quando uma menina loura conseguir
Preces dos lábios do pecado,
Quando a velha amendoeira florir,
E houver choros de criança,
Toda a casa fica em paz
Que volta enfim a Canterville.”

In O Fantasma dos Canterville,
de Oscar Wilde (Editorial Estampa, 1973, pp. 37-38)





Halloween ou o Dia das Bruxas





A festa do Halloween celebra-se em vários países no dia 31 de outubro, véspera da festa cristã do Dia de Todos os Santos.
Alguns estudiosos do assunto defendem que a sua origem remonta às tradições celtas do festival Samhain, celebrado na Irlanda, Escócia e Ilha de Man entre 30 de outubro e 2 de novembro, e que marcava o fim do verão (samhain significa "fim do verão"), associado também às festas das colheitas e ao culto dos mortos. Outros afirmam que a festa do Halloween começou independentemente do Samhain e tem raízes cristãs. Pensa-se que o primeiro registo do termo "Halloween" seja de cerca de 1745, uma contração do termo escocês All Hallows' Eve, que significa “véspera [do Dia de] Todos os Santos”, o que dá mais força à teoria da origem cristã da festa.
A romanização e consequente cristianização das Ilhas Britânicas terão contribuído para a fusão das duas tradições, a pagã e a cristã, e já em finais da Idade Média surge o costume dos "disfarces", muito possivelmente nascido na França por altura do flagelo da Peste Negra, que criou entre os católicos um grande temor e preocupação com a morte.
No entanto, se analisarmos o modo como o Halloween é celebrado hoje, veremos que pouco tem a ver com as suas origens: só restou uma alusão aos mortos, mas com um caráter completamente distinto do que tinha ao princípio. Além disso, foi sendo pouco a pouco incorporada toda uma série de elementos estranhos tanto à festa de Finados como à de Todos os Santos, a maior parte com origem nos Estados Unidos da América (onde a tradição da celebração do Halloween terá chegado com os colonos irlandeses), tais como as lanternas feitas de abóbora, o jogo do "doce ou travessura", contar histórias assustadoras, assistir a atrações "assombradas” ou a filmes de terror. Na verdade, tornou-se uma celebração mais comercial e secular, perdendo parte do seu cariz religioso.

Vemos, portanto, que a atual festa do Halloween é produto da fusão de muitas tradições, levadas pelos colonos britânicos no século XVIII para os Estados Unidos e ali integradas de modo peculiar na sua cultura. Muitas delas já foram esquecidas na Europa, onde hoje, por colonização cultural dos Estados Unidos, aparece o Halloween, enquanto desaparecem algumas tradições locais.

terça-feira, 24 de outubro de 2017

24 de outubro de 1929: a “quinta-feira negra” nos Estados Unidos da América e uma sugestão de leitura


Assente numa frágil prosperidade que vinha desde o fim da Primeira Guerra Mundial, que elevou os Estados Unidos à categoria de primeira potência mundial, nos finais da década de 1920 a economia americana enfrentou uma crise sem precedentes que rapidamente se propagou a todos os países que com eles tinham laços económicos e financeiras e que se arrastou pelos primeiros anos da década de 1930, originando o que ficou conhecido na História como a Grande Depressão.
Favorecidos por uma conjuntura bélica que afastou do seu território os efeitos devastadores da Grande Guerra, ao mesmo tempo que abasteciam a Europa e os mercados mundiais de bens essenciais, os Estados Unidos saíram economicamente beneficiados do conflito, apresentando, em 1919, uma imagem de sucesso, assente na sua prodigiosa capacidade de produção e na prosperidade da sua balança de pagamentos. Sob o lema de uma produção em massa para um consumo de massa, viveram-se os anos da prosperidade americana e os “loucos anos 20” na Europa, caracterizados por um clima de otimismo e de confiança no capitalismo liberal.
No entanto, essa era de prosperidade era afinal precária. A mecanização da produção fez crescer o desemprego crónico ou tecnológico, que chegou a atingir cerca de 2 milhões de pessoas; a produção excedentária na agricultura originou a queda de preços e a queda de lucros; a maior parte do consumo era realizada com recurso a créditos bancários, incluindo a aquisição de ações, pois, acreditando na solidez da sua economia, muitos americanos investiam na Bolsa, fazendo crescer a especulação financeira e elevando cada ação a um valor que não era real.
A descida dos preços e dos lucros industriais alarmou os grandes acionistas, que rapidamente começaram a dar ordem de venda dos seus títulos.
A 21 de outubro de 1929, essas ordens de venda começaram a acumular-se na Bolsa de Nova Iorque. A 24 de outubro, o pânico instalou-se, quando 13 milhões de títulos foram colocados à venda a preços baixíssimos e sem encontrarem comprador. Começava assim o crash de Wall Street e nos meses que se seguiram centenas de milhares de acionistas conheceram a ruína, o que significou também a ruína de todo o sistema bancário sobre o qual assentava a aquisição da maior parte das ações. Entre 1929 e 1933, mais de 10 mil bancos encerraram devido à falência, arrastando consigo toda a economia, com a falência de empresas, a contração da produção e a queda dos preços. Da indústria à agricultura, todo o aparelho produtivo dos Estados Unido ruiu e, em 1933, mais de 12 milhões de americanos estavam desempregados.

Em 1939, o escritor norte-americano John Steinbeck publicou As Vinhas da Ira, romance que é ainda hoje universalmente considerado a obra-prima de John Steinbeck, premiado com o Prémio Pulitzer em 1940 e que haveria de justificar a atribuição do Prémio Nobel da Literatura, em 1962, a este autor.
Passado durante a Grande Depressão dos inícios dos anos 30, o romance centra-se nos Joads, uma família pobre de rendeiros expulsos da sua quinta no Oklahoma pela seca, pelas dificuldades económicas e pela execução de dívidas pelos bancos, que forçaram o abandono pelos rendeiros do seu modo de vida. Numa situação desesperada, os Joads, procurando emprego, terra, dignidade e um futuro e acompanhando cerca de meio milhão de "Okies” sem casa, partiram para oeste, rumo à Califórnia, o que provocou um dos maiores êxodos verificados no país. Este romance é ainda o retrato épico do desapiedado conflito entre os poderosos e aqueles que nada têm, do modo como um homem pode reagir à injustiça, e também da força tranquila e estoica de uma mulher.
Em 1940, John Ford realizou um filme homónimo, que contou com Henry Fonda numa magnífica interpretação do papel de Tom Joad.

“[...] e nos olhos dos famintos há uma ira crescente. Nas almas das pessoas, as vinhas da ira estão engrossando e ficando mais pesadas, ficando mais pesadas para a vindima.”


As Vinhas da Ira é uma obra intemporal, que ainda hoje nos faz refletir sobre a fragilidade dos seres humanos e sobre a sua capacidade de reinvenção de uma nova vida.


Dia das Nações Unidas



Em 24 de outubro de 1945, no fim da Segunda Guerra Mundial, foi fundada a Organização das Nações Unidas, uma organização intergovernamental criada com os objetivos de promover a cooperação internacional, manter a segurança e a paz mundial, promover os direitos humanos, auxiliar no desenvolvimento económico e no progresso social, proteger o meio ambiente e prover ajuda humanitária em casos de fome, desastres naturais e conflitos armados.
Face aos insucessos da Sociedade das Nações (SDN, organização criada em 1919, após a Primeira Guerra Mundial, igualmente com o objetivo de manter a paz e a harmonia entre as nações, e que, contudo, não conseguiu evitar a invasão japonesa da Manchúria em 1931, a Segunda Guerra Ítalo-Etíope e as expansões alemãs sob o comando de Adolf Hitler, que culminaram na Segunda Guerra Mundial), nas conferências interaliados realizadas entre 1941 e 1945 com o intuito de definir a nova ordem internacional após o conflito, o presidente dos Estados Unidos, Franklin Roosevelt, defendeu a criação de um novo organismo, mais consistente e forte do que havia sido a SDN.
Assim, o primeiro plano concreto para a criação de uma nova organização mundial surgiu ainda durante a Segunda Guerra Mundial, quando o presidente dos Estados Unidos Franklin Roosevelt e o primeiro-ministro britânico Winston Churchill se reuniram na Casa Branca, em 29 de dezembro de 1941 e começaram a discutir a criação de uma agência que sucederia à Sociedade das Nações. Oficialmente, a ONU nasceu na Conferência de São Francisco, em abril de 1945, quando foi elaborada a Carta das Nações Unidas, a qual entrou em vigor a 24 de outubro de 1945.
Em 1948, a ONU reforçou a sua feição profundamente humanista, com a aprovação da Declaração Universal dos Direitos do Homem, que passou a integrar os documentos fundamentais da organização.
Na altura da sua fundação, a ONU tinha 51 estados-membros; hoje, são 193. Com exceção do Vaticano, todos os países do Mundo fazem parte da ONU. A sua sede está localizada em Manhattan, Nova Iorque, e possui extraterritorialidade.
O período da Guerra Fria, iniciado após a Segunda Guerra Mundial, tornou difícil e complicada a missão da ONU nas suas primeiras décadas de existência. O clima de tensão e antagonismo entre os Estados Unidos e a União Soviética e respetivos aliados, a corrida aos armamentos, a proliferação de conflitos localizados e as crises militares em diversas zonas do mundo fragilizaram a atuação da ONU, que não conseguiu impedir a Guerra da Coreia, as guerras do conflito israelo-árabe ou a Guerra do Vietname.
Os órgãos principais que compõem as Nações Unidas são:
  • a Assembleia Geral: assembleia deliberativa, formada pela generalidade dos Estados e que funciona como um parlamento mundial;
  • o Conselho de Segurança: responsável pela manutenção da paz e da segurança (composto por 15 membros, cinco dos quais permanentes: Estados Unidos, Rússia, Reino Unido, França e República Popular da China);
  • o Secretariado-Geral, à frente do qual se encontra o secretário-geral eleito pela Assembleia, por proposta do Conselho de Segurança; compete-lhe coordenar o funcionamento burocrático da Organização e disponibilizar os seus serviços diplomáticos como mediador das questões mais delicadas. O secretário-geral representa a ONU e, com ela, todos os povos do mundo; desde 2017, este cargo, o mais alto na estrutura da organização, é ocupado pelo português António Guterres;
  • o Conselho Económico e Social: encarregado de promover a cooperação económica, social e cultural entre as nações; atua através de comissões especializadas;
  • o Tribunal Internacional de Justiça: órgão máximo da justiça internacional, resolve, à luz do direito internacional, os litígios entre Estados; tem sede em Haia;
  • o Conselho de Direitos Humanos: para promover e fiscalizar a proteção dos direitos humanos e propor tratados internacionais sobre esse tema.

Além destes, há organismos especializados, complementares de todas as outras agências do Sistema das Nações Unidas, como a Organização Mundial de Saúde (OMS), o Programa Alimentar Mundial (PAM), o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), o Banco Mundial (BIRD – Banco Internacional para a Reconstrução e o Desenvolvimento), o Fundo Monetário Internacional (FMI), a Organização para a Agricultura e Alimentação (FAO) ou a Organização para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO).

Para conhecer mais sobre esta organização e a sua missão e atividades:

24 de outubro – Dia das Nações Unidas

Mensagem do Secretário-Geral das Nações Unidas

Nações Unidas: 72 anos de desafios e conquistas

Dia das Nações Unidas 2017 - Factos

História da Carta das Nações Unidas

ONU – Portugal e CPLP

Centro Regional de Informação das Nações Unidas




sexta-feira, 20 de outubro de 2017

Prémio Leya 2017


O Prémio Leya 2017, o maior para uma obra inédita escrita em Língua Portuguesa, foi hoje atribuído ao escritor João Pinto Coelho com o romance Os loucos da rua Mazur.
João Pinto Coelho, que nasceu em Londres, em 1967, já tinha sido finalista do Prémio Leya, em 2014, com o romance Perguntem a Sarah Gross.
Licenciado em Arquitetura, este escritor viveu a maior parte da sua vida em Lisboa. Passou várias temporadas nos Estados Unidos da América, onde chegou a trabalhar num teatro profissional, perto de Nova Iorque.

Em 2009 e 2011, integrou duas ações do Conselho da Europa que tiveram lugar em Oświęcim, onde ficava o campo de concentração de Auschwitz, trabalhando de perto com diversos investigadores do Holocausto. Foi durante este período na Polónia que concebeu e implementou o projeto “Auschwitz in 1st Person/A Letter to Meir Berkovich” e que surgiu a ideia para o seu romance de estreia, Perguntem a Sarah Gross, sobre uma mulher carismática e misteriosa que dirige o colégio mais elitista da Nova Inglaterra, nos Estados Unidos da América. “Perguntem a Sarah Gross é um romance trepidante que nos dá a conhecer a cidade que se tornou o mais famoso campo de extermínio da História”, refere a sinopse disponível no sítio da Leya.


Com o romance agora premiado Os loucos da rua Mazur, João Pinto Coelho regressa à Polónia, em dois tempos distintos: a Segunda Guerra Mundial e a atualidade.
O Presidente do Júri do Prémio Leya, Manuel Alegre, salientou que “Os loucos da rua Mazur” foi premiado «pela sua qualidade literária e também pela sua singularidade», uma vez que retrata a violência cometida numa «pequena comunidade da Polónia». Ao contrário de outras obras sobre a Segunda Guerra Mundial, o romance de João Pinto Coelho aborda a «crueldade cometida pela comunidade sobre a própria comunidade. [...] É uma das comunidades que extermina outra, não se passa em Auschwitz».

Ainda segundo Manuel Alegre, este é «um livro muito bem escrito, com muita força», que aborda a temática do extermínio dos judeus, acrescentando que o romance tem «personagens fortíssimas» e cujas «qualidades de efabulação e verosimilhança em episódios de violência brutal com motivações ideológico-políticas e étnico-religiosas, emergindo de uma convivência comunitária multissecular» foram as mais apreciadas pelos jurados. «De igual modo, o júri valorizou a criação de personagens com densa singularidade existencial, no triângulo perturbador de amizade e conflito amoroso dos protagonistas, tal como de figuras secundárias com valor simbólico». Para o júri, é ainda «de salientar a força humana de um protagonista, o velho livreiro cego, que irá ficar como uma figura inesquecível da nossa ficção mais recente».



domingo, 1 de outubro de 2017

Dia Mundial da Música



Dia Mundial da Música

O dia 1 de outubro foi instituído como o Dia Mundial da Música, em 1975, pelo International Music Council, organização não governamental fundada com o apoio da UNESCO em 1948 e que integra a maior rede mundial de instituições e organizações que trabalham na área da música, com o objetivo de levar a música a todos os setores da sociedade, divulgar a diversidade musical e promover os valores da paz e da amizade por seu intermédio.


Música e Pintura
“A cor é um meio para exercer uma influência direta sobre a alma. A cor é a tecla. A alma é o piano com mutas cordas. O artista é a mão que, por esta ou aquela tecla, faz vibrar adequadamente a alma humana.”
Kandinsky

Na História da Arte, encontramos muitos exemplos da relação existente entre a Música e a Pintura. Um dos mais claros é o nascimento da abstração nas mãos do pintor russo Wassily Kandinsky (1866-1944) e do atonalismo nas mãos do compositor austríaco Arnold Schönberg (1874-1951).

Em 1911, Kandinsky publicou o livro Do espiritual na arte, muito admirado por Schönberg. Por seu lado, foi após ouvir em Munique as Três peças para piano, opus 11 de Schönberg que Kandinsky pintou Impressão III (Concerto).

Kandinsky, Impressão III (Concerto) (1911)

A negação da figuração na pintura de Kandinsky veio ao encontro de uma música que evitava qualquer escala musical já usada, sendo que os dois confessavam que o objetivo de suas ações era o mesmo: a transcendência espiritual. Os críticos afirmam que nunca houve, na história da música, uma tão grande sintonia entre dois artistas como esta.
A palavra-chave para designar esta fusão entre música e pintura, entre sons e cores, é sinestesia e foi precisamente Kandinsky quem foi mais longe na defesa da sinestesia como componente inevitável da arte concebida como um todo. Para este pintor, um quadro podia ser a representação visual de uma composição musical e não é por acaso que muitas das suas obras se intitulam Composição.

Kandinsky, Composição VIII (1923)

Também nas “colagens musicais” que o compositor russo Ygor Stravinsky (1882-1971) fez para o bailado Petruschka, em 1911, podemos encontrar uma relação entre música e pintura, pois que são contemporâneas das colagens feitas na mesma época pelos pintores Pablo Picasso (1881-1973) e Georges Braque (1882-1963)A colaboração entre este compositor e Picasso materializa-se na produção de guarda-roupa e cenários por Picasso para o bailado Pulcinella, de 1920.

Pablo Picasso, estudos para Pulcinella

Outros exemplos da presença da música na pintura:


Jan Vermeer, Lição de Música (1662)




Giacomo Balla, The Hand of the Violinist (1912)


Pablo Picasso, Violino e uvas (1912)


Autor do mês de outubro - Agustina Bessa-Luís


Agustina Bessa-Luís
“A grandeza dum espírito está na pluralidade e plenitude da sua sensibilidade. Todo o vasto espírito é sempre um tanto santo e outro tanto demoníaco. Todo o artista exagera ou dilui, aviva ou simplifica.”
Agustina Bessa-Luís, nome literário de Maria Agustina Ferreira Teixeira Bessa, nasceu em Amarante, Vila Meã, a 15 de outubro de 1922. Entre os mais de cinquenta títulos que publicou, encontram-se romances, contos, peças de teatro, biografias romanceadas, crónicas de viagem, ensaios e livros infantis.
A infância e adolescência passadas na região do Douro marcarão fortemente os ambientes da sua obra. Foram as primeiras leituras de escritores franceses e ingleses encontrados na biblioteca do avô materno que despertaram em Agustina o amor pela literatura, começando a escrever ainda na adolescência.
A sua estreia como romancista acontece em 1948, com a publicação da novela Mundo Fechado, a que se seguiu, em 1950, o romance Os Super-Homens. No entanto, seria com o romance A Sibila, publicado em 1954, que Agustina Bessa-Luís se impõe como uma das vozes mais importantes da ficção portuguesa contemporânea.
Surgindo numa altura em que o panorama literário português se caracterizava pela oposição entre o neorrealismo e o modernismo do movimento da Presença, o seu interesse pela vida e obra de um dos grandes expoentes da escola romântica, Camilo Castelo Branco, cuja herança se faz sentir quer a nível temático (inúmeras das suas obras têm como protagonista a sociedade de Entre Douro e Minho), quer a nível da técnica narrativa (explorou ficcionalmente a própria vida de Camilo), leva o ensaísta Eduardo Lourenço a associar Agustina à corrente neorromântica.
Também podemos encontrar na sua obra influências de autores como Raul Brandão, Proust ou Bergson. A preocupação de Agustina pela condição social e cultural dos portugueses leva-a a recorrer à ficção para problematizar o conhecimento histórico e vivencial.
Além da atividade literária, a escritora envolveu-se noutros projetos. Foi membro do Conselho Diretivo da Comunitá Europea degli Scrittori (Roma); colaborou em várias publicações periódicas, tendo sido entre 1986 e 1987 diretora do diário O Primeiro de Janeiro (Porto); entre 1990 e 1993 assumiu a direção do Teatro Nacional de D. Maria II (Lisboa). Foi membro da Alta Autoridade para a Comunicação Social e da Academie Européenne des Sciences, des Arts et des Lettres (Paris), da Academia Brasileira de Letras e da Academia das Ciências de Lisboa (Classe de Letras).
Em 1981, foi distinguida com o grau de Grande-Oficial da Ordem Militar de Sant'Iago da Espada, tendo sido elevada ao grau de Grã-Cruz da mesma ordem em 26 de Janeiro de 2006. Em 2004, aos 81 anos, recebeu o mais importante prémio literário da língua portuguesa: o Prémio Camões. Em 2005 foi-lhe atribuído o título de doutor honoris causa pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto.
Vários dos seus romances foram adaptados ao cinema pelo realizador Manuel de Oliveira, com quem manteve uma relação de amizade e de colaboração próxima. Exemplos desta parceria são Fanny Owen (Francisca, 1981), Vale Abraão (filme homónimo, 1993), As Terras do Risco (O Convento, 1995) ou A Mãe de um Rio (Inquietude, 1998).
Agustina Bessa-Luís deixou de escrever em Julho de 2006, pouco depois de terminar a sua última obra, A Ronda da Noite, retirando-se da vida pública devido a razões de saúde.
“Fim - o que resta é sempre o princípio feliz de alguma coisa.”

[Agustina Bessa-Luís morreu no dia 3 de junho de 2019, no Porto]

Obra (assinalam-se a negrito os títulos que integram o catálogo da Biblioteca do Externato Cooperativo da Benedita)
Ficção
1948 - Mundo Fechado (novela)
1950 - Os Super-Homens (romance)
1951-1953 - Contos Impopulares (conto)
1954 - A Sibila (romance)
1956 - Os Incuráveis (romance)
1957 - A Muralha (romance)
1958 - O Susto (romance)
1960 - Ternos Guerreiros (romance)
1961 - O Manto (romance)
1962 - O Sermão do Fogo (romance)
1964 - As Relações Humanas: I - Os Quatro Rios (romance)
1965 - As Relações Humanas: II - A Dança das Espadas (romance)
1966 - As Relações Humanas: III - Canção Diante de uma Porta Fechada (romance)
1967 - A Bíblia dos Pobres: I - Homens e Mulheres (romance)
1970 - A Bíblia dos Pobres: II - As Categorias (romance)
1971 - A Brusca (contos)
1975 - As Pessoas Felizes (romance)
1976 - Crónica do Cruzado OSB (romance)
1977 - As Fúrias (romance)
1979 - Fanny Owen (romance histórico)
1980 - O Mosteiro (romance)
1983 - Os Meninos de Ouro (ação)
1983 - Adivinhas de Pedro e Inês (romance histórico)
1984 - Um Bicho da Terra (romance histórico, biografia de Uriel da Costa)
1984 - Um Presépio Aberto (narrativa)
1985 - A Monja de Lisboa (romance histórico, biografia de Maria de Visitação)
1987 - A Corte do Norte (romance histórico)
1988 - Prazer e Glória (romance)
1988 - A Torre (conto)
1989 - Eugénia e Silvina (romance)
1991 - Vale Abraão (romance)
1992 - Ordens Menores (romance)
1994 - As Terras do Risco (romance)
1994 - O Concerto dos Flamengos (romance)
1995 - Aquário e Sagitário (narrativa)
1996 - Memórias Laurentinas (romance)
1997 - Um Cão que Sonha (romance)
1998 - O Comum dos Mortais (romance)
1999 - A Quinta Essência (romance)
1999 - Dominga (conto)
2000 - Contemplação Carinhosa da Angústia (antologia)
2001 - O Princípio da Incerteza: I — Jóia de Família (romance)
2002 - O Princípio da Incerteza: II — A Alma dos Ricos (romance)
2003 - O Princípio da Incerteza: III — Os Espaços em Branco (romance)
2004 - Antes do Degelo (romance)
2005 - Doidos e Amantes (romance)
2006 - A ronda da noite (romance)
Biografias
1979 - Santo António
1979 - Florbela Espanca
1981 - Sebastião José
1982 - Longos Dias Têm Cem Anos — Presença de Vieira da Silva
1986 - Martha Telles: o Castelo Onde Irás e Não Voltarás (ensaio e biografia)
Teatro
1958 - Inseparável ou o Amigo por Testamento
1986 - A Bela Portuguesa
1992 - Estados Eróticos Imediatos de Soren Kierkegaard
1996 - Party: Garden-Party dos Açores — Diálogos
1998 - Garret: O Eremita do Chiado
Crónicas, memórias, textos ensaísticos
1961 - Embaixada a Calígula (relato de viagem)
1979 - Conversações com Dimitri e Outras Fantasias (crónicas)
1980 - Arnaldo Gama — “Gente de Bem”
1981 - A Mãe de um Rio (texto e fotografia)
1981 - Dostoievski e a Peste Emocional
1981 - Camilo e as Circunstâncias
1982 - António Cruz, o Pintor e a Cidade
1982 - D.Sebastião: o Pícaro e o Heroíco
1982 - O Artista e o Pensador como Minoria Social
1984 - ”Menina e Moça” e a Teoria do Inacabado
1986 - Apocalipse de Albrecht Dürer
1987 - Introdução à Leitura de “A Sibila”
1988 - Aforismos
1991 - Breviário do Brasil (diário de viagem)
1994 - Camilo: Génio e Figura
1995 - Um Outro Olhar sobre Portugal (relato de viagem), com fotografias de Pierre Rossollin e ilustrações de Maluda
1996 - Alegria do Mundo I: escritos dos anos de 1965 a 1969
1997 - Douro (texto e fotografia), em colaboração com Mónica Baldaque
1998 - Alegria do Mundo II: escritos dos anos de 1970 a 1974
1998 - Os Dezassete Brasões (texto e fotografia)
1999 - A Bela Adormecida
2000 - O Presépio: Escultura de Graça Costa Cabral (texto e fotografia), em colaboração com Pedro Vaz
2001 - As Meninas (texto e pintura)
2002 - O Livro de Agustina (autobiografia)
2002 - Azul (divulgação), em colaboração com Luísa Ferreira
2002 - As Estações da Vida (texto e fotografia), fot. Jorge Correia Santos
2004 - O Soldado Romano, com ilustrações de Chico
2016 - Ensaios e artigos
Literatura infantil
1983 - A Memória de Giz, com ilustrações de Teresa Dias Coelho
1987 - Contos Amarantinos, com ilustrações de Manuela Bacelar
1987 - Dentes de Rato, com ilustrações de Martim Lapa
1990 - Vento, Areia e Amoras Bravas, com ilustrações de Mónica Baldaque
2007 - O Dourado, com ilustrações de Helena Simas
Adaptações cinematográficas
1981 - Francisca, realizado por Manoel de Oliveira (adaptação do romance Fanny Owen)
1993 - Vale Abraão, realizado por Manoel de Oliveira (adaptação do romance Vale Abraão)
1995 - O Convento, realizado por Manoel de Oliveira, com Catherine Deneuve e John Malkovich (adaptação do romance As Terras do Risco)
1996 - Party, realizado por Manoel de Oliveira (adaptação da peça Party: Garden-Party dos Açores)
1998 - Inquietude, realizado por Manoel de Oliveira (adaptação do conto A Mãe de um Rio), Prémio Globo de Ouro (1999) para a melhor realização
2002 - O Princípio da Incerteza, realizado por Manoel de Oliveira (adaptação do romance O Princípio da Incerteza)
2005 – Espelho Mágico, realizado por Manoel de Oliveira (adaptação do romance A Alma dos Ricos)
2009 – A Corte do Norte, realizado por João Botelho (adaptação do romance A Corte do Norte)


Prémios
Prémios à autora
1975 - Prémio "Adelaide Ristori" (Centro Cultural Italiano de Roma)
1982 - Prémio da Cidade do Porto
1988 - Prémio Seiva de Literatura (Companhia de Teatro Seiva Trupe), Porto
1993 - Medalha de Mérito Cultural
1996 - Prémio Bordalo de Literatura (Casa da Imprensa)
2004 - Prémio Camões - o mais importante prémio literário da língua portuguesa
2004 - Prémio Vergílio Ferreira (Universidade de Évora)
2005 - Prémio de Literatura do Festival Grinzane Cinema, Turim (Itália)
Prémios às obras
1953 - Prémio Delfim Guimarães (Guimarães Editores) (A Sibila)
1954 - Prémio Eça de Queirós (Secretariado Nacional de Informação) (A Sibila)
1966 - Prémio Ricardo Malheiros (Academia das Ciências de Lisboa) (Canção Diante de uma Porta Fechada)
1967 - Prémio Nacional de Novelística (Secretariado Nacional de Informação) (Homens e Mulheres)
1977 - Prémio Ricardo Malheiros (Academia das Ciências de Lisboa) — Prémio Literário (As Fúrias)
1980 - Prémio P.E.N. Clube Português de Ficção (O Mosteiro)
1980 - Prémio D. Dinis (Fundação Casa de Mateus) (O Mosteiro)
1983 - Prémio de Romance e Novela, Associação Portuguesa de Escritores (Os Meninos de Ouro)
1988 - Prémio RDP Antena 1 da Literatura (Ex-aequo) (Prazer e Glória)
1993 - Prémio da Crítica (Centro Português da Associação Internacional de Críticos Literários) (Ordens Menores)
1994 - Prémio Municipal Eça de Queirós (Câmara Municipal de Lisboa) — Prémio de Prosa de Ficção (As Terras do Risco)
1996 - Prémio Máxima de Literatura (Memórias Laurentinas e Party)
1997 - Prémio Internacional União Latina, Itália (Um Cão que Sonha)
2001 - Grande Prémio de Romance e Novela da Associação Portuguesa de Escritores (Jóia de Família)