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quinta-feira, 5 de novembro de 2020

Dia Mundial do Cinema

 

Em 2020, celebram-se os 125 anos da primeira sessão pública de cinema, a sessão do cinematógrafo dos Irmãos Lumière que, após inventarem o cinematógrafo, fizeram a primeira exibição pública e paga da arte do cinema: uma série de dez filmes, com duração de 40 a 50 segundos cada. Estávamos em 1895 e, na cave do Grand Café, em Paris, os primeiros espetadores puderam assistir à projeção dos filmes "A saída dos operários da Fábrica Lumière" e "A chegada do comboio à Estação Ciotat".


Os irmãos Lumière

A chegada do comboio à Estação Ciotat


Já nos inícios do século XX, o mágico ilusionista francês Georges Méliès realizou, produziu e exibiu "Le Voyage dans la Lune" (ou "Viagem à Lua"), um filme de apenas 14 minutos, cujo argumento se inspira na obra de Jules Verne, tornando pioneiro em alguns efeitos especiais, criador da fantasia na produção e realização de filmes.

Georges Meliès

Viagem à Lua

Auguste e Louis Lumière e Georges Meliès deram assim origem a dois géneros fundamentais do cinema: o cinema documental e o cinema de ficção.



domingo, 1 de novembro de 2020

Poemas de António Gedeão

Pedra filosofal

Eles não sabem que o sonho

é uma constante da vida

tão concreta e definida

como outra coisa qualquer,

como esta pedra cinzenta

em que me sento e descanso,

como este ribeiro manso

em serenos sobressaltos,

como estes pinheiros altos

que em verde e oiro se agitam,

como estas aves que gritam

em bebedeiras de azul.

 

Eles não sabem que o sonho

é vinho, é espuma, é fermento,

bichinho álacre e sedento,

de focinho pontiagudo,

que fossa através de tudo

num perpétuo movimento.

 

Eles não sabem que o sonho

é tela, é cor, é pincel,

base, fuste, capitel,

arco em ogiva, vitral,

pináculo de catedral,

contraponto, sinfonia,

máscara grega, magia,

que é retorta de alquimista,

mapa do mundo distante,

rosa-dos-ventos, Infante,

caravela quinhentista,

que é Cabo da Boa Esperança,

ouro, canela, marfim,

florete de espadachim,

bastidor, passo de dança,

Colombina e Arlequim,

passarola voadora,

pára-raios, locomotiva,

barco de proa festiva,

alto-forno, geradora,

cisão do átomo, radar,

ultra-som, televisão,

desembarque em foguetão

na superfície lunar.

 

Eles não sabem, nem sonham,

que o sonho comanda a vida.

Que sempre que um homem sonha

o mundo pula e avança

como bola colorida

entre as mãos de uma criança.



Lágrima de preta

Encontrei uma preta

que estava a chorar

pedi-lhe uma lágrima

para a analisar


Recolhi a lágrima

com todo o cuidado

num tubo de ensaio

bem esterilizado

 

Olhei-a de um lado

do outro e de frente

tinha um ar de gota

muito transparente

 

Mandei vir os ácidos

as bases e os sais

as drogas usadas

em casos que tais

 

Ensaiei a frio

experimentei ao lume

de todas as vezes

deu-me o qu'é costume

 

Nem sinais de negro

nem vestígios de ódio

água (quase tudo)

e cloreto de sódio



Fala do homem nascido

Venho da terra assombrada

do ventre de minha mãe

não pretendo roubar nada

nem fazer mal a ninguém

 

Só quero o que me é devido

por me trazerem aqui

que eu nem sequer fui ouvido

no acto de que nasci

 

Trago boca pra comer

e olhos pra desejar

tenho pressa de viver

que a vida é água a correr

 

Venho do fundo do tempo

não tenho tempo a perder

minha barca aparelhada

solta o pano rumo ao norte

meu desejo é passaporte

para a fronteira fechada

 

Não há ventos que não prestem

nem marés que não convenham

nem forças que me molestem

correntes que me detenham

 

Quero eu e a natureza

que a natureza sou eu

e as forças da natureza

nunca ninguém as venceu

 

Com licença com licença

que a barca se fez ao mar

não há poder que me vença

mesmo morto hei-de passar

com licença com licença

com rumo à estrela polar

Autor do mês - Rómulo de Carvalho / António Gedeão ou a simbiose entre ciência e poesia

 


(fotografia de Eduardo Gageiro)


No mês em que se comemora o Dia Mundial da Ciência, em homenagem a Charles Darwin e à data da primeira edição do livro A Origem das Espécies, 24 de novembro de 1859, prestamos tributo a Rómulo de Carvalho, o professor de Ciências Físico-Químicas que para muitos será sempre conhecido e reconhecido como o poeta António Gedeão.

Cientista, poeta, investigador, historiador, escritor, fotógrafo, pintor e ilustrador, Rómulo de Carvalho nasceu em Lisboa, num outro 24 de novembro, mas de 1906, e faleceu em Lisboa, a 19 de fevereiro de 1997, com 90 anos. Além de professor de ciências e de poeta, juntando na mesma pessoa duas sensibilidades diferentes, destacou-se também como divulgador e historiador da ciência, da pedagogia e, em geral, da cultura portuguesa.

Em 1996, foi instituído em Portugal o dia 24 de novembro como Dia Nacional da Cultura Científica, escolhido precisamente para comemorar o nascimento de Rómulo de Carvalho, um dos grandes responsáveis pela promoção do ensino de ciência e da cultura científica em Portugal.

Licenciado em Ciências Físico-Químicas pela Universidade do Porto em 1931, Rómulo de Carvalho formou-se um ano depois em Ciências Pedagógicas na Faculdade de Letras da mesma Universidade, iniciando a que foi a sua atividade principal durante 40 anos: professor e pedagogo.

Para Rómulo de Carvalho, ensinar era uma paixão, uma dedicação. Durante muitos anos, concentrou os seus esforços no ensino, dedicando-se, também, à elaboração de manuais escolares, inovadores pelo grafismo e pela forma de abordar matérias tão complexas como a física e a química. Assinou com o seu nome numerosos volumes de divulgação da cultura científica, publicados, entre os anos 50 e 70 do século XX, na coleção "Ciência para gente nova" e nos "Cadernos de iniciação científica”. Desenvolveu ainda trabalhos de investigação sobre a história da ciência e do ensino em Portugal.

Na Universidade de Coimbra, o seu nome continua a inspirar cientistas e estudantes através do RÓMULO Centro Ciência Viva da Universidade de Coimbra, inaugurado a 24 de Novembro de 2008, Dia Nacional da Cultura Científica e dia do seu nascimento, e dirigido atualmente pelo professor Carlos Fiolhais.

Apesar da intensa atividade científica, Rómulo de Carvalho dedicou-se também à poesia. Em 1956, aos 50 anos, publicou o primeiro livro de poemas, Movimento Perpétuo. No entanto, o livro surge como tendo sido escrito por outro, António Gedeão, e o professor de física e química, Rómulo de Carvalho, permanece no anonimato. O livro é bem recebido pela crítica e António Gedeão continua a publicar poesia, aventurando-se, anos mais tarde, no teatro, no ensaio e na ficção.

A obra de Gedeão, que parece não se enquadrar claramente em qualquer movimento literário, revela as suas preocupações com os problemas comuns da sociedade portuguesa.

Vários dos seus poemas foram divulgados através das músicas compostas por José Niza, compiladas no álbum "Fala do Homem Nascido", como Calçada de Carriche (para a voz de Carlos Mendes), Fala do Homem Nascido (cantado por Adriano Correia de Oliveira) ou Lágrima de Preta, simbiose perfeita entre a ciência e a poesia, além do intemporal Pedra Filosofal, hino à liberdade e ao sonho que Manuel Freire musicou e cantou.

Aos 83 anos, em 1990, Rómulo de Carvalho assumiu a direção do Museu Maynense da Academia das Ciências de Lisboa, sete anos depois de se ter tornado sócio correspondente da Academia de Ciências, função que desempenhou até ao fim dos seus dias.

Rómulo de Carvalho deu origem a uma família de cientistas e escritores: o filho, Frederico de Carvalho, é físico nuclear; a filha, Cristina Carvalho, é escritora; a neta, Margarida Gama Carvalho, é bióloga no Instituto de Medicina Molecular da Universidade de Lisboa.

Jaz no Jazigo dos Escritores Portugueses, no Talhão dos Artistas do Cemitério dos Prazeres, em Lisboa, junto de outros notáveis da literatura portuguesa, como José Cardoso Pires ou Fernando Namora.


Obras de Rómulo de Carvalho na Biblioteca do ECB

  • História do Gabinete de Física da Universidade de Coimbra: desde a fundação (1772) até ao jubileu do professor italiano Giovanni Antonio Dalla Bella (1790)
  • História do ensino em Portugal: desde a fundação da nacionalidade até ao fim do regime de Salazar-Caetano
  • História dos balões
  • O texto poético como documento social
  • As origens de Portugal: história contada a uma criança
  • A composição do ar (Cadernos de iniciação científica)
  • As reacções químicas (Cadernos de iniciação científica)
  • Moléculas, átomos e iões (Cadernos de iniciação científica)
  • A estrutura cristalina (Cadernos de iniciação científica)
  • A energia (Cadernos de iniciação científica)
  • A descoberta do mundo físico (Cadernos de iniciação científica)

Obras de António Gedeão na Biblioteca do ECB

  • Poesias completas: (1956-1967)
  • Poesias escolhidas: antologia organizada pelo autor
  • História Breve da Lua


Para conhecer melhor a vida e a obra de Rómulo de Carvalho/António Gedeão, sugerimos os sítios:

António é meu nome. Biblioteca Nacional

http://purl.pt/12157/1/#ant#rec#rec


Sítio desenvolvido por Ana Carolina Cassoni © 2007

http://www.romulodecarvalho.net/content/view/1/2/


RÓMULO Centro Ciência Viva da Universidade de Coimbra

Rómulo de Carvalho, Alquimista, pelo professor Carlos Fiolhais

https://www.uc.pt/iii/romuloccv/romulo