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sexta-feira, 18 de maio de 2018

Dez Mil Guitarras, de Catherine Clément: uma sugestão de leitura no Dia Internacional dos Museus

Porto Editora, 2010

No Dia Internacional dos Museus, apresentamos como sugestão de leitura o romance Dez Mil Guitarras, de Catherine Clément. Entre as suas personagens, encontramos Rodolfo II, Imperador da Áustria, cujas "Câmaras de Arte e Prodígios" (ou "Salas das Maravilhas") podem ser consideradas precursoras do moderno conceito de Museu. 

Catherine Clément nasceu em França, em 1939, e é autora de mais de trinta livros. Iniciou a sua carreira académica na área da Filosofia, formando-se na Ecole Normale Supérieure, onde teve como professores Claude Lévi-Strauss ou Jacques Lacan, com quem trabalhou em estudos de antropologia e psicanálise. Mais tarde começou a dedicar-se à ficção, particularmente no género do romance histórico.
As suas obras estão hoje traduzidas em mais de 24 línguas.



Em Dez Mil Guitarras, Catherine Clément transporta-nos para a Europa de finais do século XVI, apresentando-nos uma galeria de retratos de uma Europa em mutação: o peso dos Habsburgo, a violência das guerras religiosas, a loucura do Imperador da Áustria, a rebelião da jovem rainha Cristina da Suécia e a sua paixão por Descartes.
Entretanto, em Marrocos, dez mil guitarras jazem ao abandono no campo de batalha de Alcácer-Quibir. D. Sebastião desapareceu. Morto ou vivo? Há quem espere por ele...
Ao contar-nos essa espera, Catherine Clément compõe um romance como uma ópera, pleno de fantasia e de verdades pouco conhecidas, dando voz a personagens memoráveis, como o famoso rinoceronte que atravessou toda a Índia e que, depois de ter navegado de Goa para Lisboa, se encontra enjaulado para deleite de soberanos: um jovem rei português, um velho rei de Espanha, um imperador alquimista, uma rainha bárbara.

“Tive como proprietários dois reis, um imperador e uma rainha que semeava tempestades. Nenhum deles foi francamente mau; místico, devoto, iluminado, rebelde, procuravam uma grande ideia, que eu vi nascer. As belezas da ideia e os seus crimes, as suas loucuras, as guerras intermináveis, os prazeres desenfreados e a sua obstinação em perseguir não sei o quê, a ramagem das árvores, as caçadas, as divisões, era a obstinação da Europa em sobreviver.”

Quem assim fala é o rinoceronte (o bada, na terminologia da época), um ser extraordinário que é a alma migrada de um brâmane hindu. E é através dos seus relatos que vamos percorrendo as cortes mais afamadas da Europa entre 1577, vésperas da batalha de Alcácer-Quibir, e 1689, data da morte da Rainha Cristina da Suécia.
Adquirido pelo rei D. Sebastião de Portugal, herdado por Filipe II de Espanha, e depois (já morto e com o corno transformado em cálice) pelo imperador Rodolfo II do Sacro-Império Romano-Germânico, levado para a corte sueca em 1648, este rinoceronte encontra-se hoje no Kunsthistorisches Museum de Viena.
São muito diferentes as personalidades dos sucessivos proprietários do bada:
  • D. Sebastião de Portugal, um rei que nasce Desejado e morre Encoberto, eivado ainda do ideal de cruzada e que, em nome de Deus e do Império, morrerá (ou não...) em Marrocos;
  • Rodolfo de Habsburgo, imperador da Áustria, verdadeiro espírito da época, prenúncio da modernidade, para quem as descobertas científicas são mais importantes do que as divisões religiosas ou políticas; as suas Câmaras de Arte e Prodígios (ou Salas das Maravilhas) reuniam tudo o que na época era considerado exótico ou maravilhoso, desde animais a objetos; conhecido como “O Alquimista”, na sua corte encontramos homens como os astrónomos Tycho Brahé e Johannes Kepler, ou o pintor Giuseppe Arcimboldo, que retratará Rodolfo II no célebre Vertumnus;
  • e ainda a rainha Cristina da Suécia, em cujo reinado assistimos ao desenrolar da Guerra dos Tinta Anos, que começa por uma questão religiosa e se transforma numa guerra por territórios.

No final, o bada dirá

“Na verdade, os reis são pouca coisa.”

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