menu

sexta-feira, 1 de outubro de 2021

Pepetela - autor do mês de outubro

 


“Nasci na Gabela, na terra do café. Da terra recebi a cor escura do café, vinda da mãe, misturada ao branco defunto do meu pai, comerciante português. Trago em mim o inconciliável e é este o meu motor. Num Universo de sim e não, branco ou negro, eu represento o talvez. Talvez é não para quem quer ouvir sim e significa sim para quem espera ouvir não. A culpa será minha se os homens exigem a pureza e recusam as combinações? Sou eu que devo tornar-me em sim ou em não? Ou são os homens que devem aceitar o talvez? Face a este problema capital, as pessoas dividem-se aos meus olhos em dois grupos: os maniqueístas e os outros. É bom esclarecer que raros são os outros, o Mundo é geralmente maniqueísta”.

Pepetela


Artur Carlos Maurício Pestana dos Santos, que assina sempre como Pepetela, nasceu em Benguela, em 29 de Outubro de 1941, numa família com raízes entre os colonos de Angola, sendo os seus pais angolanos de nascimento.

“Pepetela” significa Pestana em umbundo (uma língua banta falada pelos ovimbundos, povo originário das montanhas centrais de Angola; é a língua banta mais falada no país, principalmente nas províncias centrais do Bié, do Huambo e de Benguela).

Pepetela realizou os primeiros estudos em Benguela, onde permaneceu até 1956, ano em que partiu para Lubango, para completar o ensino secundário, no Liceu Diogo Cão. Em 1958, foi para Lisboa, com o objetivo de estudar no Instituto Superior Técnico, mudando em 1960 para o curso de Letras na Universidade de Lisboa.

Em Lisboa, integrou a Casa dos Estudantes do Império (CEI), uma instituição criada pelo regime salazarista, em 1944, para albergar os vários estudantes das colónias portuguesas que vinham estudar na metrópole, no intuito de fortalecer a mentalidade imperial e o sentimento da portugalidade entre os estudantes das colónias e que funcionava de maneira semelhante a uma república estudantil. Contrariando os objetivos do regime, a CEI acabou por fomentar a ação política entre os estudantes negros e mestiços presentes na metrópole, vindo alguns a formar o Movimento Anticolonial (MAC), que se colocou num plano político de oposição frontal ao regime colonial português e do qual saíram alguns dos fundadores e dirigentes dos movimentos nacionalistas nas colónias portuguesas, como Agostinho Neto (MPLA), Amílcar Cabral (PAIGC) ou Joaquim Chissano (FRELIMO). A CEI foi fechada pela Polícia Internacional e de Defesa do Estado (PIDE) a 6 de setembro de 1965.

É na Casa dos Estudantes do Império que Pepetela começa a sua trajetória política e literária. Além de colaborar nas publicações da CEI, será um dos criadores do Centro de Estudos Angolanos, o qual integra enquanto representante do MPLA.

Após o início da luta armada de libertação em Angola, em 1961, seguiu para o exílio em França e mais tarde na Argélia, onde terminará o curso de Sociologia.

Em 1975, após a independência de Angola, Pepetela regressa ao seu país, assumindo o cargo de Vice-Ministro da Educação, sob a liderança do Presidente Agostinho Neto. A partir de 1982, deixou de desempenhar cargos políticos e dedicou-se quase em exclusivo à escrita, sendo também professor na Faculdade de Arquitetura da Universidade Agostinho Neto em Luanda.

A obra literária de Pepetela, que começou ainda nos tempos do exílio e da guerrilha (embora a maior parte só seja publicada após o seu regresso a Angola), reflete a história de Angola, tanto a mais distante, quanto a mais recente trajetória social e política do país.

O primeiro romance de Pepetela, As Aventuras de Ngunga, foi publicado em 1972, e nele podemos acompanhar o crescimento revolucionário de Ngunga, um jovem guerrilheiro do MPLA.


Entre outros dos seus livros mais importantes encontramos Muana puó (de 1978, obra que analisa a situação angolana através da metáfora das máscaras dos Côkwes, uma etnia de Angola); Mayombe (de 1980, uma narrativa da guerra pela independência, que retrata as vidas e os pensamentos de um grupo de guerrilheiros, escrita a partir da experiência do próprio autor); Iaka (de 1985, um romance histórico que segue a vida de uma família colonial na cidade de Benguela ao longo de um século).

Na década de 1990, a obra de Pepetela continua a refletir o interesse na história de Angola, mas também examina a situação política do país com um maior sentido de ironia e criticismo. O seu primeiro romance da década, A geração da utopia (de 1992), mostra a realidade e a desilusão de Angola pós-independência, quando a guerra civil e a corrupção no governo levaram ao questionamento dos valores revolucionários.

Em Parábola do cágado velho (1996), uma história de amor num cenário de guerra, vista pelos olhos de um camponês, Pepetela retoma o tema dos mitos e tradições angolanos. A gloriosa família (de 1997) é um romance histórico que examina a história da família Van Dúnem, uma família proeminente de ascendência holandesa.

Pepetela atinge o auge de sua carreira literária em 1997, quando conquista, pela totalidade de sua produção, o Prémio Camões, um dos mais prestigiados e desejados pelos escritores de língua portuguesa. Pepetela foi o autor mais jovem a receber este prémio, o primeiro angolano e o segundo africano a receber esta distinção (depois do escritor moçambicano José Craveirinha, em 1991). Antes disso, recebera o Prémio Nacional de Literatura de Angola pela obra Mayombe. Este reconhecimento consagra-o como um nome significativo da literatura contemporânea em língua portuguesa.

O primeiro livro que publicou nos 2000 foi A Montanha de Água Lilás, de 2000, um livro para crianças que propõe uma reflexão sobre o consumismo e a degradação do meio ambiente e comenta as raízes da injustiça social.

A obra de Pepetela nos anos 2000 critica a atual situação angolana, com textos que contam com um estilo satírico e que incluem a série de romances policiais protagonizada pelo detetive Jaime Bunda que satirizam a vida em Luanda. As suas obras recentes também incluem Predadores (2005), uma crítica áspera das classes dominantes de Angola; O Quase Fim do Mundo (2008), uma alegoria pós-apocalíptica, num tempo em que a vida animal desaparece da Terra, exceto num pequeno recanto do mundo que escapou à hecatombe e se situa numa desgraçada zona da desgraçada África; e O Planalto e a Estepe (2009), a história real de um amor impossível na Angola dos anos 60 aos nossos dias e que examina as ligações entre Angola e outros países ex-comunistas.


Entre as últimas obras publicadas por Pepetela, encontramos A Sul. O Sombreiro, de 2011, um grande romance de aventuras que nos conduz a Angola dos séculos XVI e XVII, quando Portugal vivia sob o domínio filipino; O Tímido e as Mulheres, de 2013, onde acompanhamos o tímido Heitor, um escritor em início de carreira, na Luanda dos dias de hoje, uma narrativa original com um desfecho imprevisível, que retrata os últimos vinte anos da história de Angola a partir da história de dois órfãos vítimas da guerra que dependem do lixo dos restaurantes e se unem para conseguirem subsistir.

Em 2018, no romance Sua Excelência de Corpo Presente, vencedor do Prémio Literário Casino da Póvoa 2020, é pelas memórias de um ditador africano (que, apesar de jazer morto num caixão num enorme salão, aprisionado num corpo sem vida, vê, ouve e pensa, na posse das suas faculdades intelectuais) que conhecemos o percurso que o levou a presidente e os muitos anos como chefe de Estado e os meandros do poder político, o nepotismo que o corrói e os vários abusos permitidos a quem o detém.


A maior parte da obra de Pepetela faz parte do Plano Nacional de Leitura

Obras de Pepetela

(*) disponível na biblioteca do ECB

Romances

1972 - As Aventuras de Ngunga (*)

1978 - Muana Puó (*)

1979 – Mayombe (*)

1985 - O Cão e os Caluandas (*)

1985 – Yaka (*)

1990 – Lueji (*)

1992 - Geração da Utopia (*)

1995 - O Desejo de Kianda (*)

1997 - Parábola do Cágado Velho (*)

1997 - A Gloriosa Família (*)

2000 - A Montanha da Água Lilás (*)

2001 - Jaime Bunda, Agente Secreto (*)

2003 - Jaime Bunda e a Morte do Americano (*)

2005 – Predadores (*)

2007 - O Terrorista de Berkeley, Califórnia (*)

2008 - O Quase Fim do Mundo (*)

2008 - Contos de Morte (*)

2009 - O Planalto e a Estepe (*)

2011 - A Sul. O Sombreiro (*)

2013 - O Tímido e as Mulheres (*)

2016 - Se o Passado Não Tivesse Asas (*)

2018 - Sua Excelência de Corpo Presente (*)

Peças

1978 - A Corda

1980 - A Revolta da Casa dos Ídolos

Crónicas

2011 - Crónicas com Fundo de Guerra (*)

2015 - Crónicas Maldispostas (*)


Sem comentários:

Enviar um comentário