A Academia Sueca atribuiu hoje o
Prémio Nobel da Literatura à escritora sul-coreana Han Kang, nascida em 1970,
em Gwangju, na Coreia do Sul. Entre 121 laureados, é a 18.ª mulher a receber este
galardão.
De acordo com o comunicado da Academia
Sueca, Han Kang é premiada com o Nobel da Literatura de 2024 pela sua “intensa prosa poética que confronta traumas
históricos e expõe a fragilidade da vida humana. […] Na sua obra, Han Kang
confronta traumas históricos e normas invisíveis e, em cada um dos seus
trabalhos, expõe a fragilidade da vida humana. A autora tem uma consciência
única das ligações entre o corpo e a alma, os vivos e os mortos, e, com o seu
estilo poético e experimental, tornou-se uma inovadora na prosa contemporânea”.
Formada em Literatura Coreana pela
Universidade de Yonsei, estreou-se como autora publicada em 1993, ao assinar
cinco poemas numa edição da revista local Literatura
e Sociedade.
Apesar de ter lançado dois romances e
uma coleção de contos antes, foi com A Vegetariana, com o qual venceu o
Internacional Booker, em 2016, que ganhou protagonismo internacional. Foi o seu
primeiro livro a ser traduzido para inglês e ser editado em Portugal, em 2016,
pela Dom Quixote.
Ela era absolutamente normal. Não era bonita, mas também não era feia. Fazia as coisas sem entusiasmo de maior, mas também nunca reclamava. Deixava o marido viver a sua vida sem sobressaltos, como ele sempre gostara. Até ao dia em que teve um sonho terrível e decidiu tornar-se vegetariana. E esse seu ato de renúncia à carne – que, a princípio, ninguém aceitou ou compreendeu – acabou por desencadear reações extremadas da parte da sua família. Tão extremadas que mudaram radicalmente a vida a vários dos seus membros – o marido, o cunhado, a irmã e, claro, ela própria, que acabou internada numa instituição para doentes mentais. A violência do sonho aliada à violência do real só tornou as coisas piores; e então, além de querer ser vegetariana, ela quis ser puramente vegetal e transformar-se numa árvore.
Talvez uma árvore sofra menos do que
um ser humano.
(da sinopse da edição portuguesa de
2016, disponível na Biblioteca da Escola Secundária Dona Inês de Castro, Agrupamento de Escolas de Cister)
Atos
Humanos (2017), sexto romance da autora e o segundo
a ser publicado em Portugal, recupera o massacre de 18 de maio de 1980 na
região de Gwangju, na Coreia do Sul. Em 1980, estudantes de norte a sul do país
revoltaram-se contra o fecho de universidades e a falta de liberdade de
expressão. Porém, foi na região de Gwangju que a repressão foi mais violenta,
acabando a população por se juntar ao protesto, dando origem a um dos piores
massacres na história do país. Os mortos e desaparecidos ainda estão, ainda,
por contabilizar. Como lidar com a morte de alguém quando o seu corpo não
aparece? Kang e a família deixaram Gwangju quatro meses antes dos massacres, mudando-se
para Seul.
Atos
Humanos é a história de Dong-ho, um rapaz que não
resistiu a seguir o melhor amigo até à manifestação, mas, quando ouviu os
tiros, largou-lhe a mão, procurando-o agora entre os cadáveres de uma morgue
improvisada. E é também a história dos que cruzaram o caminho de Dong-ho antes
e depois dessa noite infame – os que caíram por terra desarmados e os que foram
levados para a prisão e torturados; os que sobreviveram ao terror mas nunca
mais conseguiram falar do assunto e os que, tantos anos passados, sabem, tal
como Han Kang, que a história pode repetir-se a qualquer momento e que é
preciso lembrar os atos brutais de que os humanos são capazes. Este é um
romance universal e moderno sobre a batalha que os fracos travam contra os fortes
na luta pela justiça.
(da sinopse da edição portuguesa de 2017)
O
Livro Branco, publicado em Portugal em 2019, pelas
Publicações Dom Quixote, é uma meditação sobre luto e memória, considerado o mais
autobiográfico e simultaneamente experimental livro de Han Kang.
O livro começa com uma simples lista
de coisas brancas: a neve, o sal, a espuma das ondas, o papel, o arroz, os
cabelos dos velhos, as cobertas em que a mãe da autora embrulhou a primeira
filha, que nasceu prematura, muitos anos antes de existir este livro. É também
uma reflexão sobre o luto, o renascimento e a tenacidade do espírito humano e
uma investigação sobre a beleza, a fragilidade e a estranheza da vida: se, por
exemplo, a sua irmã tivesse sobrevivido, teria Han Kang chegado a nascer?
Poderíamos nós ler a sua história tão tocante?
(da sinopse da edição portuguesa de
2019)
Lições
de Grego (2023), o seu último livro, conta a história
de um professor de Grego que está a perder a visão e de uma aluna que está a
perder a voz. Ambos descobrem, porém, que existe uma dor ainda mais funda a
uni-los: numa questão de meses, ela perdeu a mãe e a batalha pela custódia do
filho; já ele ganhou o medo de perder a autonomia e o incómodo de, por ter
crescido entre a Coreia do Sul e a Alemanha, estar sempre dividido entre duas
culturas e duas línguas tão diferentes.
Lições
de Grego fala de um homem e de uma mulher comuns que
se conhecem num momento de angústia privada – a perspetiva da cegueira dele
encontra-se com o silêncio dela. Mas são justamente estes handicaps que os
atraem um para o outro, levando-os a encontrar uma saída da escuridão para a
luz, do silêncio para a expressão.
Com uma estrutura em espiral e a
sensibilidade a que Han Kang já nos habituou, o presente romance é como uma
terna carta de amor à intimidade humana, um texto que desperta os nossos
sentidos e reflete sobre a essência do que realmente significa estar vivo.
(da sinopse da edição portuguesa de 2023)